terça-feira, 21 de outubro de 2014

A urgência dos procedimentos de massa - uma nova abordagem à luz da reforma do Processo.

Muito já foi dito quanto aos Processos em Massa (e quanto às alterações introduzidas nesse âmbito pelo Projecto de Revisão do Código de Processo nos Tribunais Administrativos) regulados no artigo 48º mas, a este respeito, existem outras novidades introduzidas pelo Projecto que, quanto a nós, importa analisar. 
Nos artigos 97º a 99º, o legislador pretende criar “o contencioso dos atos administrativos praticados no âmbito de procedimentos de massa”.
Onde, até agora, existiram apenas regras relativas ao contencioso eleitoral, parece querer surgir também regras especificas para os procedimentos (urgentes) de massa. A primeira nota a este respeito é sobre esta explicita (mas, a nosso ver, infundada) opção de conjugar duas matérias que em nada se identificam. Não compreendendo esta opção (a nosso ver merecia uma regulamentação autónoma), as mais relevantes criticas virão adiante.
Quanto ao âmbito destas normas consideramos que a expressão “contencioso dos actos administrativos” transmite, à partida, uma sensação de amplitude (quanto ao objecto) maior do que na realidade está aqui em causa. Se não vejamos:
i) abrange apenas procedimentos “cujos participantes (ou envolvidos) sejam em numero superior a 20” - art.99º, nº1, alínea a) e c).
ii) quanto aos tipos de procedimentos: “concursos de pessoal”, “realização de provas” e “procedimentos de recrutamento” - respectivamente, alínea a), b) e c) do nº1 do art.99º. 
iii) abrange apenas algumas pretensões: pretensões de “anulação, declaração de nulidade ou inexistência de atos administrativos e/ou de condenação à prática de atos devidos” - art.97º, nº2. 
Daqui se depreende, necessariamente, que o objecto é concretamente definido e limitado. Esta limitação pode ser compreendida pela necessidade de reduzir o âmbito do procedimento para garantir o seu caracter de urgência e evitar uma discriminação injustificada daqueles que acedem aos tribunais (que beneficiariam de um tratamento diferenciado, quanto ao mesmo objecto, consoante a escolha do procedimento).
No nº2 do art.99º o legislador insere uma novidade, ao que parece alvo das mais variadas criticas, consagrando um desvio à regra geral da competência territorial: todos os processos urgentes relativos a procedimentos de massa serão da competência do Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa (quanto a nós, com excepção dos casos previstos no nº1 do artigo 20º: quando se trate de procedimentos da competência das “Regiões Autónomas, das autarquias locais e demais entidades de âmbito local, das pessoas colectivas de utilidade pública e de concessionários”, que neste caso deverão ser “intentados no tribunal da área da sede da entidade demandada”). 
A par desta alteração, sempre tendo em vista o caracter de urgência, estabeleceu a regra da coligação e da apensação obrigatória. Daqui concluímos: i) sendo obrigatória, apenas exige que as pretensões em causa respeitem ao mesmo procedimento de massa e ii) qualquer acção proposta autonomamente será apensada ao primeiro processo de massa intentado. Ora, esta solução também não é isenta de criticas uma vez que não permite a avaliação concreta da pretensão e do pedido de cada acção. Com a ânsia de agilizar o processo, podemos correr o risco de complexificar de tal forma que torne ainda mais morosa a decisão. 

No geral, compreendemos a necessidade de alargar o âmbito dos procedimentos urgentes aos processos em massa mas a concretização do legislador, na proposta para a nova redação do CPTA, poderá vir a criar problemas complexos e de difícil resolução.  Verdade é que as providências cautelares não resolveriam os problemas típicos da urgência dos Processos em Massa porque o que se pretende é uma decisão célere mas definitiva e não uma decisão célere mas simulada, que fica na pendência de uma acção principal. Independentemente da posição tomada, a avançar com este novo paradigma, é necessário que se criem as condições práticas e humanas para fazer face ao volume de processos que esta acção trará. 

Carolina Melo

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