segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Processos de Massa na Reforma de 2014

A reforma do Contencioso Administrativo é algo pelo qual se aguarda há já algum tempo. Pretende-se com ela garantir uma maior adequação do Contencioso Administrativo face ao desenvolvimento jurídico substantivo e à prática processual nos nossos Tribunais Administrativos.

Todavia, a reforma de nada vale por si própria, tendo naturalmente de se traduzir numa melhoria do panorama jurídico existente, no que toca ao Contencioso. Veremos se é isso que se passa num caso muito concreto: os processos de massa, previstos no artigo 48º CPTA.

O regime dos processos em massa pretende concretizar o Princípio da Economia Processual, não descurando o Acesso ao Direito e a Tutela Jurisdicional Efectiva.

Vejamos então as alterações:

O novo artigo 48º propõe no seu número 1 que bastem 10 processos intentados no mesmo tribunal para que - verificados os restantes requisitos, nomeadamente que digam respeito à mesma relação jurídica material ou que sejam susceptíveis de ser decididos com base na aplicação das mesmas normas a idênticas situações de facto - se possa aplicar o regime dos processos em massa.

De forma algo dicotómica, esclarece o número 4 que apesar do número 1 referir processos "no mesmo tribunal", o regime também se poderá aplicar se o número resultar de um conjunto de processos em tribunais diferentes, podendo esse impulso partir quer de qualquer um dos presidentes dos tribunais envolvidos, quer das próprias partes.

O número 5, todavia, limita a decisão final de aplicação do regime dos processos em massa ao Presidente do Supremo Tribunal Administrativo.

O número 6 desta proposta de artigo 48º remete ainda os processos em massa para o regime dos processos urgentes, aplicando-se nestes casos a proposta de artigo 99º, quanto à tramitação urgente de processos em massa.
Se se olhar com atenção para este artigo 99º, todavia, conclui-se que é bem mais restrito do que inicialmente parecia, tendo como requisito a prática ou omissão de um acto administrativo num de três domínios possíveis: i) concursos de pessoal; ii) realização de provas; iii) recrutamento e sempre que o número de processos seja 20 ou superior.
Ou seja, pretende o legislador facilitar ao máximo os processos em massa para escoar os processos idênticos nos Tribunais, permitindo ainda um acesso aos processos de massa urgente em situações muito concretas - e de certa forma, algo politizadas - como os concursos, a realização de provas e o recrutamento.

Adiante, diz o número 2 que o prazo de proposição de acções é de um mês só e a competência está limitada ao Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.
Não se percebe esta decisão, até porque é contraditória, centralizando os processos em massa "candidatos" a processos em massa urgentes num só Tribunal, o que inevitavelmente contribuirá para um atraso nos restantes processos do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, que é precisamente o inverso daquilo que se queria com a facilitação dos processos em massa.

Depois, estatui o número 3 que o modelo dos articulados é fixado por Portaria, decisão que não me parece ideal porque gerará enorme insegurança processual e pode levar a que os próprios particulares vejam acções suas ser declaradas improcedentes devido excepções dilatórias causadas pela confusão causada por constantes alterações no modelo dos articulados.

Por último, do número 4 do artigo 99º se extrai que há uma prioridade temporal que foi estabelecida de forma rígida.
Mais uma vez discordo deste preceito, porque o processo "principal" (ao qual os restantes processos em massa se apensam) deveria ser aquele ao qual corresponder a maior amplitude possível, de forma a rentabilizar ao máximo o processo de massas. Especialmente se se tiver em conta os limites do artigo 95º quando à alegação de factos.

De forma geral, são estas as alterações propostas quanto aos processos em massa do CPTA.

Um juízo mais completo e acertado acerca das consequências que esta alteração terá dependerá naturalmente do entendimento que os Tribunais vierem a fazer destes preceitos e daquilo que a prática processual vier a demonstrar. Certo é que a vontade em lubrificar o Contencioso Administrativo é por si só algo de louvar, pois não existe maior violação ao artigo 20º da Constituição do que Tribunais demorados e inacessíveis.

Miguel Baptista - 140111505

Sem comentários:

Enviar um comentário