- Âmbito da Jurisdição Administrativa em Matéria Ambiental -
A Constituição da República
Portuguesa (doravante CRP) consagra no n.º 1 do seu art. 66.º o princípio
jurídico-constitucional da sustentabilidade ambiental do desenvolvimento
económico e social. Fá-lo ao prever que “todos
têm direito a um ambiente de vida humana, sadio e ecologicamente equilibrado e
o dever de o defender”.
No n.º2 do referido artigo, são
definidos conjuntos de tarefas impostas ao Estado para assegurar o direito ao
ambiente, tarefas estas que deverão ser prosseguidas “por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a participação
dos cidadãos”.
Primeira questão que se suscita
consta em determinar o que se entende por “ambiente”. Neste sentido encontramos
a al. a) do n.º2 do art. 5.º da Lei n.º19/2014 de 14 de Abril – anterior Lei de
Bases do Ambiente -, que vem definir ambiente como “o conjunto de sistemas físicos, químicos, biológicos e suas relações e
dos factores económicos, sociais e culturais, com efeito directo ou indirecto,
mediato ou imediato, sobre os serres vivos e a qualidade de vida do homem”.
Segunda questão é saber o
conteúdo do preceito constitucional. Desde logo, este direito compreende uma
dimensão negativa que se materializa no direito à abstenção, por parte do
Estado e de terceiros, de acções nocivas para o ambiente. Nesta dimensão o
direito ao ambiente está abrangido pelo regime específico dos direitos
liberdades e garantias, do art. 18.º da CRP.
Numa dimensão negativa, integra
o direito a uma acção por parte do Estado no sentido de defender o ambiente e
de controlar as acções de degradação ambiental, impondo-lhes as correspondentes
obrigações políticas, legislativas, administrativas e penais. Esta dimensão
mostra-se especialmente relevante pois, com o desenvolver da questão ecológica,
facilmente se compreendeu a necessidade de intervenção política que viesse no
sentido de a controlar. Tal controlo constaria no reequilíbrio do sistema de
justiça ambiental no seu plano intrageracional e de responsabilidade ética pelo
futuro.
Mais se diga que esta dualidade
foi reconhecida no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10 de Março de
2010 (Proc. n.º 046262), em que se reconhece ainda o direito ao ambiente como
sendo um direito fundamental.
Ao lado do direito ao ambiente
atribuído aos cidadãos, surge simultaneamente o dever de o defender. A defesa
consta, como referido, da obrigação de não atentar contra o ambiente e, para o
que neste contexto releva, no dever de impedir atentados de outrem, nomeadamente
pelo exercício da acção popular, prevista no n.º3 do art. 52.º da CRP.
A acção popular é aqui
conferida uma vez que nos encontramos no âmbito dos interesses difusos, que
forçam a nossa Lei Fundamental a garantir aos cidadãos o direito de desencadear
a intervenção dos tribunais no sentido de defesa desses sem que tenham de
demonstrar ser titulares de um interesse directo e legítimo na relação jurídica
de que deriva a sua pretensão.
Afirmado o direito ao ambiente
como direito fundamental, e reconhecida a obrigação de defesa deste, importa
agora analisar a forma como o sistema jurídico português enquadra os conflitos
que surgem neste contexto.
Ora, nos termos do n.º3 do art.
212.º da CRP, compete aos tribunais administrativos o julgamento das acções e recursos
contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações
jurídicas administrativas. Este conceito de relação jurídica administrativa
refere-se a acções e recursos em que pelo menos um dos sujeitos é titular,
funcionário ou agente de um órgão do poder público, e às relações
controvertidas, reguladas sob o ponto de vista material do direito
administrativo.
Isto visto, parece que são de
direito administrativo as relações jurídicas litigiosas que se constituem
quando a actividade desenvolvida por um particular lesa outro no seu direito a
viver num ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado.
O âmbito da jurisdição dos
Tribunais Administrativos resulta ainda do n.º1 do art.4.º do Estatuto dos
Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º13/2002, de 19 de
Fevereiro. Nomeadamente, as alíneas a), b), h) e i) do supracitado artigo vêm absorver
grande parte dos litígios em sede ambiental.
Vimos já que a utilização de
recursos naturais está sujeita ao princípio de gestão racional, acarretando por
isso uma intervenção prévia da Administração relativamente ao desenvolvimento
de determinadas actividades. Daí que haja uma proliferação de actos autorizativos
e de normas de onde decorrer parâmetros de actuação. Concretizando, e tomando
em consideração al. b), vemos que esta alínea se refere, por exemplo, a autorizações
administrativas concedidas quer a entes jurídico-públicos, quer a entes
jurídico-privados. O que se discute é a decisão da Administração em autorizar
um acto efectiva ou potencialmente lesivo que concretiza a relação jurídica
administrativa. Tendo em conta o dever de protecção do interesse público por
parte da Administração, uma tal autorização vem transportar o litígio emergente
para a jurisdição administrativa.
Também a al. l) vem estender a
tutela ambiental às acções ou omissões da Administração que sejam
potencialmente lesivas. Neste caso a Administração será responsável por uma actuação
em si mesma lesiva, e não pela autorização prévia de tal acto.
Em jeito de conclusão, a tutela
contenciosa ambiental é jurídico-pública uma vez que o bem em causa é tanto
colectivo como público, estando a sua promoção e protecção entregues
primariamente a entidades públicas. Assim é pois os titulares dos interesses de
facto na fruição do ambiente são os membros da colectividade em geral, e
ninguém em particular.
Caberá então a essa mesma colectividade
participar na promoção, junto dos tribunais administrativos, de iniciativas
processuais de defesa do ambiente.
Inês Metello - 140111090
Inês Metello - 140111090
Sem comentários:
Enviar um comentário