quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Análise da temática dos processos em Massa (Artº 48º CPTA)


No seguimento da aula de 14 de Outubro torna-se fundamental analisarmos o artº 48º do CPTA introduzido pela Reforma do Contencioso Administrativo Português. O preceito refere-se aos processos em massa ou seja quando sejam intentados mais de 20 processos relativos à mesma relação jurídica material (ainda que reportados a diferentes pronúncias administrativas) ou susceptíveis de serem decididos com base na aplicação das mesmas normas a idênticas situações de facto. Historicamente, este mecanismo teve origem do Direito Espanhol, nomeadamente através da Ley de la Jurisdicción Contencioso-Administrativa (art. 37.º, 38.º e 111.º). Esta forma processual específica apresenta como requisitos : Ter mais de 20 processos (ACPTA reduz para 10);  Reportados a diferentes pronúncias da mesma entidade administrativa; Respeitantes à mesma relação material/respeitantes a diferentes relações materiais suscetíveis de ser decididas com base na aplicação das mesmas normas a idênticas situações;
Autores como Mario Aroso de Almeida apelidam-no como “um regime de conteúdo inovador” contudo não está isento de dificuldade daí ser necessário ter muita cautela. Na verdade, os factos que estão na sua origem relacionam-se com a redução do número de litígios a apreciar pelos tribunais assim como com a uniformização da decisões que a respeito de decisões idênticas são proferidas pela justiça administrativa (se as partes nos processos suspensos aceitarem a decisão proferida e não fizerem uso da faculdade de requererem a continuação do processo). Apresenta inúmeras vantagens como a obtenção de decisão potencialmente uniformizada, a intervenção de todos os juízes do tribunal aumenta o grau de potencial uniformidade e desnecessidade de lidar com número elevado de processos e peças processuais diferentes.

Já, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (nº 1/2009) considera que: “Trata -se, portanto, de um expediente processual novo, a operar exclusivamente no âmbito do contencioso administrativo, determinado pelo presidente do tribunal para imprimir maior celeridade (segue o regime dos processos urgentes) e uniformidade na decisão (intervêm na decisão todos os juízes do tribunal), em processos autónomos mas instaurados com objectivos substancialmente idênticos". Efectivamente, o presidente poderá determinar, ouvidas as partes, que se escolha um (ou alguns) “processos-modelo” suspendendo-se a tramitação dos restantes. Esta escolha deve garantir que nele se debatam todos os aspectos de facto e de direito da questão não limitando o âmbito da instrução. A tramitação é a dos processos urgentes e a formação de julgamento é constituída por todos os juízes do tribunal , com o objectivo de obter uma decisão rápida e bem fundamentada. A sentença final não limita os direitos das partes dos processos suspensos pois para além de poderem desistir do seu processo (se a decisão tiver sido de improcedência e ele se conformar com a fundamentação da sentença), podem requerem a extensão ao seu caso d decisão proferida para efeitos de execução (se a sentença tiver sido favorável) ou por fim recorrer da sentença. Relativamente aos tribunais em que são intentadas as acções, questiona-se entre a necessidade ou não de serem intentados nos mesmos tribunais. A solução do artigo parece apontar para a necessidade dos 20 processos serem intentados no mesmo tribunal, ainda que haja opiniões diversas. No tocante ao nº 5 do artigo, fazendo uma interpretação literal, aconteceriam duas coisas: os juízes do processo-piloto teriam de avaliar a compatibilidade substancial dos restantes processos e os autores desses mesmos processos iriam escolher uma das soluções enumeradas no artigo. Relativamente à primeira, parece que o artigo nos leva a crer que há um novo juízo sobre a identidade dos casos e que justificou a aplicação do mecanismo do processo em massa. Este juízo é da competência do tribunal em formação alargada, que decidiu no processo-piloto. Quanto à segunda, diz-nos o artigo que as partes terão de ser notificadas. Resta saber o que poderiam fazer se não fossem notificados, justificado com o facto de manifestamente apresentarem especificidades não abrangidas pela dita decisão. Alguns autores defendem que as partes poderão usar da faculdade de recurso do Código Processo Civil, uma vez que que ficariam vedadas de usar das opções dadas pelo número 5 do artigo 48.º CPTA. Para outros, o fundamento do recurso seria o juízo propriamente dito por parte do tribunal alargado. Por isso, estaria ao alcance das partes recorrer da decisão de notificação pelo facto do processo não apresentar especificidades em relação ao que foi julgado, como o contrário. Em relação à notificação, a doutrina considera que esta deveria ocorrer sempre, ainda que o juiz determinasse que o processo suspenso apresentada especificidades em relação ao que se tinha pronunciado, mas que o autor teria oportunidade para usar das faculdades do número 5 do art. 48.º, seja qual fosse a decisão do juiz. Questão diversa é a de saber o que acontece nos casos em que o juiz decide não aplicar a sentença nos outros processos. E a solução vigente é a de que o processo deverá correr normalmente e não ficar agregado ao processo-piloto. Depois deste juízo do tribunal alargado e da notificação da parte do acórdão do processo-piloto, as partes dos processos suspensos podem, agora sim, usar das faculdades elencadas no art. 48.º, número 5 do CPTA, no prazo de 30 dias. Logo, não é aplicado automaticamente aos processos suspensos.

Dito isto, destaca-se, a seguinte linha de força da lei reformada perante a lei anterior: há uma atenção legislativa aos fenómenos dos processos em massa que necessitam de um regime especial que se manifesta no anúncio para citação dos contra-interessados no conceito de “processo-modelo” e também no reenvio prejudicial para o STA, uma vez que que ele não se justifica apenas pela novidade e dificuldade da questão como também pela possibilidade de repetição no futuro.

Em suma, como afirma o Professor João Tiago Silveira: “parece fundamental o estudo e o aprofundamento do mecanismo dos processos em massa, bem como de outros instrumentos de agilização processual. A evolução deste tipo de mecanismos e a adaptação do sistema judicial à sua existência e o seu correspondente aproveitamento é condição essencial para que os tribunais se possam adaptar ao perfil de litigância e litigantes que hoje marca presença no Contencioso Administrativo.”

 Margarida Quintino - 140109036


 

 

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