sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Contencioso pré-contratual


            - Análise do artigo 100º CPTA-

O contencioso pré-contratual é uma das modalidades de processos urgentes. É um processo especial de impugnação instituído em razão da urgência na obtenção de uma decisão de fundo sobre o mérito da causa a que se aplica o regime processual da acção administrativa especial (78° e ssgs) com as adaptações previstas no 102°. Foi o DL n° 134/98  o responsável por transpor para a ordem, jurídica interna a diretiva 89/665/CEE que procedeu à harmonização dos procedimentos a adoptar em matéria de recursos contenciosos no âmbito da celebração de contratos públicos de obras e de fornecimentos. A supra citada diretiva conhecida também como diretiva recursos visou assegurar a abertura dos contratos de direito público à concorrência comunitária sempre tendo em conta ideia como  transparência e não discriminação teve como primeiro objectivo implementar nos Estados-membros meios de recurso rápidos e eficazes em caso de violação do direito comunitário. Para além disso, implementou medidas provisórias destinadas a eliminar a ilegalidade impedindo a produção de danos em relação aos concorrentes lesados. O DL contemplava apenas os contratos de empreitada de obras publicas, de prestação de serviços e de fornecimento de bens que correspondiam às espécies abrangidas pela directiva. Neste diploma estendia se o âmbito de aplicação isto é devia ser tornado extensivo aos contratos de concessão de obras publicas ou fazendo recurso à aplicação analógica ou declarado a inconstitucionalidade. Estes obstáculos foram suprimidos pela redacção do art° 100° pois é notório que inclui explicitamente no objeto de impugnação os actos relativos à formação de contratos de concessão de obras publicas embora continue a não incluir os actos relativos à formação de contratos de concessão de serviços públicos. Os procedimentos relativos à contratação de empreitadas, de prestação de serviços e de fornecimento nos setores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações (setores que estavam excluídos da concorrência comunitária) foram submetidos a regulamentação própria através da directiva n° 93/38 CEE que foi transposta para o direito interno português 234/2004 . O artigo 48° frisa que de aplica aos procedimentos e contratos regulados por esse diploma o regime do contencioso pré-eleitoral (100° a 103° cpta). Com o surgimento da diretiva n° 2004/18/CEE (que foi transposta para o direito interno pelo Código dos Contratos Públicos) redundou as anteriores diretivas passando a regular num único texto os processos de adjudicação de contratos de empreitada de obras públicas , dos contratos públicos de serviços estabelecendo alterações em relação à delimitação do âmbito de aplicação, ao elenco dos processos adjudicatários e aos critérios de adjudicação. De acordo com a directiva recursos as impugnações podem dirigir-se não apenas à anulação de decisões ilegais também à supressão de especificações técnicas, económicas e financeiras discriminatórias incluídas no anúncio e programa do concurso ou no caderno de encargos e podem originar a atribuição de uma indemnização. O carácter impugnável dos actos relativos à formação dos contratos é determinado à luz dos princípios gerais como indica o 51º  Assim, não apenas o acto de exclusão de um candidato ou o acto final de adjudicação mas também actos procedimentais susceptíveis de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos poderão ser objecto de impugnação. Não apenas os actos primários, mas também os actos secundários como é um caso de um acto de anulação do procedimento pré-contratual ou de revogação da adjudicação são impugnáveis através do presente meio processual. Existem posições que consideram que o regime consagrado para o contencioso pré-contratual (embora o código nada diga nesse sentido e pelo contrário inclua esta forma de processo num capítulo chamado de impugnações urgentes) deve ser aplicado quer para o efeito da impugnação de actos administrativos de conteúdo positivo quer para o efeito de reacção contra actos negativos ou situações de inércia administrativa dirigida à condenação à prática de actos devidos. Efectivamente, a necessidade de assegurar a existência de um meio processual expedito para salvaguardar o princípio da concorrência no âmbito dos contratos públicos tal como se tornou exigível à luz do direito comunitário, tanto ocorre em relação a actos positivos como a actos negativos que tenham sido produzidos no âmbito do procedimento. Isto representaria um claro défice de efectividade de tutela jurisdicional se o meio processual concebido para satisfazer o interesse da urgência no domínio do contencioso pré-contratual apenas abarcasse parte dos litígios pré-contratuais que a esse nível se podem suscitar. Como ensina Sérvulo Correia assim como o acórdão do STJ 24 de Novembro de 2004 o meio urgente em analise deve ser encarado como um meio tanto impugnatório como de condenação à prática de actos administrativos. Contudo, o mais habitual será que a questão da dedução de um pedido de condenação à prática do acto devido se tenda a colocar neste contexto quando perante a prática de um acto administrativo de conteúdo positivo haja interesse na substituição desse acto por outro. Vejamos o seguinte exemplo: no acto de adjudicação do contrato a questão central que teremos de averiguar é determinar se também em relação aos actos compreendidos na previsão do art° 100°/1 é possível cumular com o pedido de anulação do acto de conteúdo positivo, o pedido de condenação à substituição desse acto por outro que não incorra nas mesmas ilegalidades. Dito isto, o contencioso pré-contratual aplica-se aos contratos celebrados pelos organismos que possam considerar-se como organismos de direito público (adoptando a concepção lata acolhida pelo direito comunitário). Aqui, estão incluídas o Estado, as regiões autónomas, as autarquias locais, os institutos públicos e as associações publicas. Também estão incluídas no preceito todas as pessoas colectivas de natureza não empresarial que independentemente da sua qualificação oficial cumpram PS seguintes requisitos objectivo:
1.       Sejam financiadas maioritariamente pelo Estado ou por outros entes públicos;
2.       Se encontrem sujeitas a controlo de gestão por parte destes últimos;
3.       Ou cujos órgãos de direcção ou fiscalização sejam, em mais de metade, designados por essas entidades públicas;
       No tocante aos contratos de empreitada, de prestação de serviços e de fornecimento nos setores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações encontram-se abrangidas pelo contencioso pré-contratual. Isto é, as entidades que operando nessas áreas se caracterizam como organismos de direito publico ou como empresas públicas. Como indica o art°1 n°2 da directiva 93/38/CEE e o art°2 n°2 do DL n°223/2001) a noção de empresa publica é: quaisquer empresas em relação às quais os poderes públicos possam exercer directa ou indiretamente, uma influencia dominante, em virtude da propriedade, da participação financeira e das normas que lhes são aplicáveis. Refira-se que a referencia do n°3 do art° 100 aos sujeitos privados, que estão habilitados para praticar actos equiparados a actos administrativos, compaginam se com as exigências comunitárias relativas à subordinação de entidades privadas a um procedimento pré-contratual de direito público. Na verdade, a citada norma em conjunção com o art°4 n°1 alínea e) do ETAF reforça o entendimento de que os tribunais administrativos são os competentes para conhecer da impugnação de actos pré –contratuais praticados por pessoas coletivas privadas quando tais entidades se encontrem sujeitas a uma disciplina procedimental de direito público. Assim, fica afastado o entendimento jurisprudencial que reputava como meras declarações negociais os actos de entidades privadas proferidos no âmbito da formação de contratos de fornecimento declinando a competência contenciosa dos tribunais administrativos em relação a tais actos (acórdão STA de 15 de Setembro de 1999 e de 3 de Abril de 2001). Questão diversa que foi amplamente debatida reconduzia-se a saber se o recurso contencioso e tratava de um meio processual de utilização necessária (sendo imperativamente aplicável em relação em relação aos actos administrativos praticados no âmbito da formação dos contratos abrangidos) ou de um meio processual alterativo cuja não utilização não impedia a impugnação contenciosa através da forma comum prevista na LPTA. Ainda hoje a questão continua a colocar-se no âmbito do CPTA embora o melhor entendimento pareça ser o de atribuir uma plena autonomização aos processos urgentes (incluindo o processo relativo ao contencioso pré-contratual) em confronto com as demais formas processuais especificamente previstas. Como tal, deve ser visto como de utilização necessária e não alternativa. Por fim, falta-nos referir a questão de saber se também em relação aos processos urgentes e em particular ao contencioso pré-contratual se valem as previsões dos artgs 4º e 47º respeitantes à cumulação de pedidos. Nomeadamente para o efeito de se admitir a cumulação do pedido de anulação do acto pré-contratual com o pedido de condenação à sua substituição por outro que não reincida nas ilegalidades cometidas como está prevista no artº 47º/2. alínea a). De acordo com os ensinamentos do Professor Mário de Aroso de Almeida tanto o artº 4 como o artº 5 não estabelecem qualquer restrição a este propósito. Não se assegura aceitável admitir que num domínio tão relevante como este não sejam proporcionadas as mesmas condições de efectividade de tutela que o Código assegura nos restantes domínios. Como indica o artº 5º que não obsta à cumulação de pedidos em processos urgentes a circunstancia de aos pedidos cumulados corresponderem outras formas de processo havendo nesse caso que seguir a forma da acção administrativa especial que as necessárias adaptações. O artº 102º à partida já estabelece isso. Se houver cumulação de outros pedidos apenas haverá que ponderar se a cumulação é de molde a justificar uma desaceleração do processo fazendo com que este siga termos que , no todo ou na parte, se afastem do modelo mais célere que resulta do artº 102º para se aproximarem do modelo normal a que obedecem os processos não urgentes. A mera cumulação no processo impugnatório do pedido de condenação da Administração à substituição do acto impugnado por outro não reincida nos mesmo vícios não parece sequer, justificar essa desaceleração na medida que as indagações a realizar incidirão em qualquer caso sobre os mesmos factos, para o efeito da aplicação das mesmas normas. E isto vale para a cumulação da impugnação do acto pré-contratual com a impugnação do próprio contrato.
 
Margarida Quintino: 140109036

Sem comentários:

Enviar um comentário