A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias
é um instituto que tem origem no Direito Espanhol, adoptado pelo legislador
português no CPTA, que permite que sejam tomadas, com extrema rapidez, decisões
de mérito, definitivas, indispensáveis para assegurar o exercício, em tempo
útil, de um direito, liberdade e garantia dos particulares.
Trata-se de um processo especial que existe para obter num
curto prazo uma intimação que se destina a salvaguardar direitos, liberdades e
garantias, concretizando assim a garantia da tutela jurisdicional efectiva
prevista no n.º 4 do artigo 268º e no n.º 5 do artigo 20º da Constituição.
Da caracterização deste instituto resulta tratar-se, em
primeiro lugar, de um processo principal e não um processo cautelar: o tribunal
é chamado a apreciar e decidir litígios através de decisões cuja função é a de
resolver definitivamente esses litígios mediante sentença transitada em
julgado.
É também um processo de intimação na medida em que é dirigido
à emissão de uma sentença de condenação, mediante a qual o tribunal impõe a
adoção de uma conduta, positiva ou negativa.
E ainda, é um processo dirigido a proteger direitos,
liberdades e garantias. Neste âmbito, coloca-se a questão de saber se o
legislador do CPTA projecta esta intimação para a defesa de direitos, liberdades
e garantias, não distinguindo (ou restringindo) entre direitos, liberdades e
garantias pessoais, de participação política ou dos trabalhadores, e ainda,
quanto aos direitos, liberdades e garantias de natureza análoga.
Existem três orientações quanto ao âmbito de aplicação deste
instituto:
1.
A
interpretação restritiva que defende que se aplica apenas a direitos,
liberdades e garantias de natureza pessoal;
2.
A
interpretação literal do preceito que com base na letra da lei defende que se
aplica a direitos, liberdades e garantias;
3.
A
interpretação com base no espírito da lei que defende a aplicação a todo e qualquer
direito fundamental - defendida pelo Professor Vasco Pereira da Silva.
A primeira orientação – a interpretação restritiva – que se
baseava na letra da lei do preceito constitucional nº 5 do artigo 20º, está
hoje absolutamente abandonada por ser unânime tratar-se de uma limitação da
garantia jurisdicional efectiva prevista no já referido nº 4 do artigo 268º da
Constituição.
O que hoje se discute é quanto à interpretação a fazer do
artigo 109º: se no sentido literal, se no sentido do espírito da lei. Uma
interpretação literal conduzir-nos-ia a uma leitura que considera que, dentro
do objecto da intimação prevista no preceito, cabem todos os direitos,
liberdades e garantias previstos no Título II da Constituição. Por sua vez, a
interpretação de acordo com o espírito da lei considera qualquer direito
fundamental, isto é, os direitos liberdades e garantias previstos nos Título II
da Constituição e ainda os direitos de natureza análoga, por força do artigo
17º da Constituição.
A nosso ver, é esta última interpretação a dar ao preceito do
CPTA na medida em que é o que está de acordo (também) com o sentido do novo
ordenamento jurídico: a intimação para direitos, liberdades e garantias abrange
todo e qualquer direito fundamental. É este o entendimento a dar ao preceito,
por diversas ordens de razões que de seguida se apresentam.
Com a introdução desta nova forma do processo o propósito
primacial do legislador era dar cumprimento a uma imposição constitucional que
apenas se reporta a direitos, liberdades e garantias de natureza pessoal (cf.
20º n.º 5 da CRP), mas, por outro lado, em nenhum momento o legislador
introduziu qualquer restrição e ainda que partindo do pressuposto que pudesse
não o ter feito, à luz do ordenamento jurídico entende-se que o legislador
optou por ir além da mera concretização da Constituição e, assim, por entender
o âmbito de intervenção deste processo de intimação à protecção de todo e
qualquer direito, liberdade e garantia, bem assim, aos direitos de natureza
análoga do artigo 17º da Constituição.
Por sua vez, como defendido pelo Professor Vasco Pereira da
Silva, a distinção dos diferentes direitos, liberdades e garantias assenta numa
falsa distinção de direitos positivos e direitos negativos, uma vez que todos
os direitos têm este duplo âmbito; bem como, esta distinção baseia-se numa
distinção puramente política que não se justifica à luz do artigo 109º do CPTA.
Ainda quanto ao objecto das intimações para protecção de
direitos, liberdades e garantias, importa referir a necessidade de evitar que
este meio seja utilizado para substituir a utilização de outros, isto é, a
necessidade de uma interpretação restritiva limitada a situações de
especialíssima urgência que por circunstâncias do caso requeiram a sua
utilização, em vez de utilizar uma acção principal assistida por uma
providência cautelar.
Do acima exposto, e sem prejuízo do necessário desenvolvimento
das diferentes ideias defendidas quanto a este meio processual do contencioso
administrativo, resulta, num primeiro momento, que a interpretação a dar ao
artigo 109º do CPTA deve tender para o alargamento sob pena de não dar
cumprimento à garantia constitucional da tutela jurisdicional efectiva aos
administrados, mas sem descurar a importante restrição que decorre do preceito
quanto à exigência de se tratar de urgência especial e receio de irreversibilidade
das consequências de tal modo que não permitam a utilização de uma providência
cautelar.
Uma vez mais, reflexo da infância difícil do contencioso
administrativo, este – e em particular neste caso, o meio processual de
intimação para proteção de direitos, liberdades e garantias – a tender para a
dualidade.
Sofia Gomes da Silva
140108126
Sofia Gomes da Silva
140108126
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