domingo, 7 de dezembro de 2014

Percurso Histórico da Providência Cautelar

No quadro da reforma de 1985 só havia uma providência cautelar: a suspensão da eficácia.

Por um lado estava regulada em termos restritos, por outra era concedida pelo juiz, porque a jurisprudência adoptava critérios mais exigentes.

Antes de 2004 não havia tutela cautelar no Direito português. Surge, então, uma preocupação europeia que influencia o legislador. Hoje, nos artigos 102º e seguintes, temos uma tutela cautelar verdadeiramente prevista.

Mas será que conseguiu-o fazer? Segundo o Professor Vasco Pereira da Silva, acredita-se que o regime é adequado, mas no que concerne à sua tramitação e regulação processual o legislador criou algumas situações absurdas. De tal modo que é possível à Administração Pública decidir se executa ou não o acto.

É uma situação criticável, que cria uma posição delicada, nomeadamente, nas regras da tramitação (no foro da insconstitucionalidade, põe em causa o princípio do acesso à Justiça; e no fora da ilegalidade, em concreto pelas normas de Direito Europeu- está em causa a eficácia da tutela cautelar).   

Antes de reforma, tínhamos um sistema que era típico e fechado. Essas providências eram chamadas de meios acessórios (havia a intimação para obter informações, regulava a suspensão da eficácia e a intimação que era um comportamento dirigido a privados). Perante isto, havia uma crítica generalizada face à insuficiência, pretendendo-se alargar estes casos tipificados, recorrendo-se ao Código Civil para esta abrangência.


Perante este cenário, havia larga discussão. O Professor Vieira de Andrade estabelecia situações que podiam ser supridas pelo Código de Processo Civil. Já a Professora Maria da Glória Garcia- analisou um conjunto de casos, relacionados com o ambiente que podiam ser adicionados supletivamente. 
    Este debate doutrinal não teve mero impacto académico, de tal modo que as posições do Professor Vasco Pereira da Silva, Freitas do Amaral e Gomes Canotilho têm impacto, sobretudo nos embargos de obra nova (parar obra visando impedir/paralisar lesão ambiental).

Mas estas construções doutrinárias, encontravam apoio relativamente reduzido. Na prática apenas se perdia a suspensão de eficácia. A prática dos tribunais ainda era mais limitativa do que a lei, pois mesmo nesses casos, os tribunais tendiam a não dar procedimento.

A partir dos anos 90 houve uma alteração de outros meios não especificados, meios do Código do Processo de Processo Civil que entravam indirectamente por influência da doutrina. Contudo esta reforma era claramente insuficiente.

Em 2004, legislador quis mudar radicalmente o sistema. Teve em atenção a tal discussão, identificou e estabeleceu os casos. Conforme o 112/1, temos um princípio de cláusula aberta em matéria de providências cautelares (antecipatória ou conservatória- critério é que se mostrem adequadas de modo a salvaguardar a utilidade da sentença).

Ainda assim, o legislador não se contentou a ter o nº1, começando a explicar, a título explicativo, exemplos de providências cautelares. No Nº2, remetendo para o CPC, reconhece que é possível usar os mecanismos especificados do procedimento civil como providência não especificada- face a isto, todos os meios do processo civil também são admitidos.

Não obstante, reconhecem-se os casos jurisprudenciais, de a) a f) é perceptível até quais os autores que tiveram essa influência legislativa, por via deste debate doutrinal.

A única excepção é a visão do Professor Freitas do Amaral. Depois de elogiar o legislador pela lógica da cláusula aberta, diz que na cauda está o veneno. Problema, na alínea f, é a intimação para adoção de uma conduta, por parte da Administração- permite-se ao particular que use a tutela cautelar com dimensão antecipatória, não tendo que haver lesão imediata (basta haver fundado receio de lesão de direitos), por isso, colocam-se críticas: corresponde a atribuir ao Contencioso Administrativo  um papel activo na resolução dos litígios, colocando em causa a realidade dos tribunais.

Em jeito de resposta, o Professor Vasco Pereira da Silva considera que há um exagero nessa posição. Freitas do Amaral atribui amplitude que ela não tem. Letra da lei diz que esta possibilidade só existe quando haja fundando receio, com base jurídica. Exemplo paradigmático disto verifica-se no urbanismo- planos de urbanização ditam que a aplicabilidade das normas esteja dependente de um acto administrativo que faça que as normas se venham a aplicar. Assim particular tem fundado receio na óptica da urbanização, se se trata de uma ilegalidade faz todo o sentido que se faça uso da providência cautelar.

Podemos, por isso, afirmar que o nosso Contencioso já respeita as exigências constitucionais e europeias, tendo o legislador realizado um bom trabalho, não obstante, de certas críticas severas, relacionadas com questões de tramitação.

Francisco Camacho, 140 111 109

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