quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Procedimentos Cautelares

No que respeita aos Procedimento Cautelares, o actual CPTA consagra uma revolução naquilo que era tradicional no Direito Português. No quadro da reforma de 1985 previa-se apenas uma categoria de Providência Cautelar “Providência de Suspensão da eficácia”, que raramente era concedida uma vez que a jurisprudência adoptava critérios ainda mais exigentes do que os da própria lei.
Ou seja, antes de 2004 praticamente não havia procedimentos cautelares em Portugal.
Este contencioso cautelar sempre foi uma das principais preocupações da União Europeia, sendo que por influencia desta, começa a surgir uma preocupação do legislador português em instituir uma tutela cautelar adequada.
Analisando o regime actual, quanto aos meios de tutela e âmbito de aplicação dos mesmos, o legislador agiu bem. Já quanto à tramitação e as regras adoptadas, tendo o legislador usado as normas do passado, isso deu origem a situações aberrantes: estabelece-se, p.e., a possibilidade de a administração executar um acto, apesar de esse acto ser formalmente ilegal.
Os problemas estão nas regras de tramitação que são, por um lado, problemas de inconstitucionalidade e, por outro, problemas de violação do Direito Europeu.
Uma vez que antes da reforma tínhamos um sistema de Providencias Cautelares típico e fechado – só existiam os “meios acessórios” previstos na lei e que correspondem às actuais Providências Cautelares: intimação para prestação de informações; suspensão de eficácia. Havia uma critica generalizada na doutrina em relação a este mecanismo, sendo sugerido um alargamento destes casos tipificados, nomeadamente através das normas previstas no Código Processo Civil.
Algumas posições doutrinarias muito marcantes nos finais do século passado, Professor Vieira de Andrade e Professora Maria da Glória Garcia foram extremamente críticos em relação ao regime anterior e chegaram mesmo a estabelecer uma serie de situações que entendia poderem e deviam ser supridas através do CPC; Professor Freitas do Amaral e Professor  Vasco Pereira da Silva defendiam a extensão destas PC a questões de ordem ambiental. No entanto tratava-se de questões doutrinarias que encontravam reduzido apoio jurisdicional.
Para além disso, a prática nos tribunais era ainda mais restritiva do que aquilo que o Código previa, ainda que houvesse remissão para o CPC, ela raramente era utilizada. Havia apenas alguns casos de suspensão de eficácia mas como refere o Professor Vasco Pereira da Silva “na altura era mais fácil encontrar um tigre na Serra da Malcata do que uma Providência Cautelar”
Nos anos 90 começou a haver algumas melhorias mas não relativamente à Providência Cautelar de Suspensão da Eficácia, mas no que respeita aqueles meios que se aplicavam subsidiariamente através dos meios do CPC e muito por pressão dos já referidos autores.
Havia alguma mudança mas os resultados eram relativamente limitados.
O legislador em 2004 quis mudar radicalmente o sistema das Providências Cautelares e teve em conta a discussão anterior no seio da nossa doutrina, resolveu então estabelecer como Providências Cautelares, no âmbito do Contencioso Administrativo, as Providências Cautelares apontadas pela doutrina.
Se lermos o artigo 112º nº1 do Código actual temos um “sistema de clausula aberta” em matéria de Providencias Cautelares, quer seja Conservatória ou Antecipatória (distinção que tem origem no Processo Civil) – o critério é que se mostrem necessárias e adequadas para garantir o efeito útil da sentença posterior.
Introduz mecanismo radicalmente diferente, e portanto só a partir de 2004 podemos verdadeiramente afirmar que passou a haver tutela cautelar no quadro do Contencioso Administrativo.
Legislador resolveu ainda especificar a titulo exemplificativo Providências Cautelares  que podiam ser requeridas. A abrir o nº2 do artigo 112º, o legislador diz que remetendo para o CPC, todas as Providências Cautelares Especificadas no CPC são aplicáveis no âmbito do contencioso administrativo (ou seja, é um segundo alargamento para alem da clausula geral do 112º nº1).
Houve uma tentativa do legislador para conciliar as diversas posições consagradas nos anos 80 e 90 na nossa doutrina.
Este mecanismo da tutela cautelar é hoje adequado. Hoje podemos afirmar que o nosso contencioso já cumpre as exigências constitucionais e as exigências europeias relacionada com as Providências Cautelares.
Depois temos várias normas que têm que ver com o regime jurídico das Providencias Cautelares.
Quanto ao momento, o legislador estabeleceu de forma inovadora, a possibilidade de as Providências Cautelares serem utilizadas antes do meio principal, sendo que nesse caso, se o meio principal não for intentado, a Providência Cautelar caduca. Podendo igualmente ser intentada no decorrer da acção principal.
Há uma clausula nos artigos 120º e 121º que é excessivamente detalhada, porque o legislador previu hipóteses praticamente automáticas. Consagra a necessidade de haver um Fumus Boni Iuris: as pretensões “têm uma fumaça do bom direito”, ou seja, desde que haja uma aparência de direito, pode em princípio ser procedente a Providência Cautelar.
Por outro lado, o legislador também estabeleceu a regra da Proporcionalidade, tendo que ser invocado um prejuízo irreparável. O legislador vai comparar em termos proporcionais as pretensões das partes e vai decidir de acordo com critérios de proporcionalidade. Professor Vasco Pereira da Silva diz que se deve afastar esta regra em que se procura encontrar “casos determinados” que reuniriam esses princípios exigidos.

Vamos as questões de tramitação, analisando aspectos muito criticáveis no quadro da reforma.
As regras de tramitação da Providencia Cautelar estão fundamentalmente nos artigos 126º e seguintes (professor faz interpretação restritiva e aplica apenas à Providência Cautelar de “suspensão da eficácia”).
A melhor forma de resolver o problema seria a de adoptar um sistema em que o particular apresenta um pedido, sendo que esse pedido tem um efeito imediato de suspensão da actuação administrativa em causa (é o que se verifica, por exemplo, na Alemanha). A suspensão seria automática, a não ser que o tribunal atribuísse à administração o poder de executar.
Este sistema segundo o Professor Vasco Pereira da Silva seria muito mais eficaz, ainda que o Legislador da reforma não tenha tido coragem para fazer isto e “criou um disparate total”.
Em primeiro lugar, aparentemente o artigo 128º nº1 parece ter criado esta logica de suspensão automática do Direito Alemão. Mas a seguir acrescenta-se “salvo se mediante razão fundamentada, a autoridade demonstrar que o deferimento da execução seria prejudicial ao interesse publico” – isto é uma aberração uma vez que estamos a colocar a decisão na mão da entidade que está a ser julgada!! Isto passou a ser a regra uma vez que não é muito difícil para a administração fundamentar a execução de um acto administrativo com base no interesse publico.
O juiz não controla a fundamentação material, quanto muito controla parcamente a fundamentação – isto está aqui por causa dos recorrentes “traumas da infância difícil”. Estes resquícios do passado não fazem qualquer sentido nos dias de hoje.
Os juízes do Supremo Tribunal Administrativo têm dito que o que está em causa é um pré-procedimento cautelar. Dizem que uma vez que as decisões sobre Providências Cautelares podem demorar muito tempo, então devemos criar um pré-procedimento cautelar. Não faz sentido!! O que é “pré” é o Procedimento Cautelar.
O que o juiz pode é verificar a fundamentação, mas essa verificação da fundamentação não constitui a analise da Providencia Cautelar.
Como este sistema tem sido muito criticado, na reforma da reforma melhorou se um bocadinho o sistema, dizendo que a alegação fundamentada da administração só pode acontecer numa situação correspondente ao Estado de Emergência ou Estado de Sítio. Ainda assim, na sua essência este mecanismo é errado.
Vasco Pereira da Silva diz que era preferível um sistema que estabelecesse a regra da suspensão automática e depois fixar um prazo (na Alemanha é de 15 dias) para o Tribunal decidir.

O legislador para além destas regras relativas à Suspensão Automática, também regula os casos da suspensão de eficácia de normas (alargamento aos Regulamentos, no seguimento de recomendação da Professora Carla Amado Gomes).


Diogo Pinto
140111018

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