No que respeita aos Procedimento Cautelares, o actual
CPTA consagra uma revolução naquilo que era tradicional no Direito Português.
No quadro da reforma de 1985 previa-se apenas uma categoria de Providência Cautelar
“Providência de Suspensão da eficácia”, que raramente era concedida uma vez que
a jurisprudência adoptava critérios ainda mais exigentes do que os da própria lei.
Ou seja, antes de 2004 praticamente não havia
procedimentos cautelares em Portugal.
Este contencioso cautelar sempre foi uma das
principais preocupações da União Europeia, sendo que por influencia desta, começa
a surgir uma preocupação do legislador português em instituir uma tutela
cautelar adequada.
Analisando o regime actual, quanto aos meios de
tutela e âmbito de aplicação dos mesmos, o legislador agiu bem. Já quanto à
tramitação e as regras adoptadas, tendo o legislador usado as normas do
passado, isso deu origem a situações aberrantes: estabelece-se, p.e., a possibilidade
de a administração executar um acto, apesar de esse acto ser formalmente
ilegal.
Os problemas estão nas regras de tramitação que são,
por um lado, problemas de inconstitucionalidade e, por outro, problemas de
violação do Direito Europeu.
Uma vez que antes da reforma tínhamos um sistema de
Providencias Cautelares típico e fechado – só existiam os “meios acessórios”
previstos na lei e que correspondem às actuais Providências Cautelares: intimação
para prestação de informações; suspensão de eficácia. Havia uma critica generalizada
na doutrina em relação a este mecanismo, sendo sugerido um alargamento destes
casos tipificados, nomeadamente através das normas previstas no Código Processo
Civil.
Algumas posições doutrinarias muito marcantes nos
finais do século passado, Professor Vieira de Andrade e Professora Maria da Glória
Garcia foram extremamente críticos em relação ao regime anterior e chegaram
mesmo a estabelecer uma serie de situações que entendia poderem e deviam ser
supridas através do CPC; Professor Freitas do Amaral e Professor Vasco Pereira da Silva defendiam a extensão destas
PC a questões de ordem ambiental. No entanto tratava-se de questões
doutrinarias que encontravam reduzido apoio jurisdicional.
Para além disso, a prática nos tribunais era ainda
mais restritiva do que aquilo que o Código previa, ainda que houvesse remissão
para o CPC, ela raramente era utilizada. Havia apenas alguns casos de suspensão
de eficácia mas como refere o Professor Vasco Pereira da Silva “na altura era
mais fácil encontrar um tigre na Serra da Malcata do que uma Providência Cautelar”
Nos anos 90 começou a haver algumas melhorias mas
não relativamente à Providência Cautelar de Suspensão da Eficácia, mas no que
respeita aqueles meios que se aplicavam subsidiariamente através dos meios do
CPC e muito por pressão dos já referidos autores.
Havia alguma mudança mas os resultados eram
relativamente limitados.
O legislador em 2004 quis mudar radicalmente o
sistema das Providências Cautelares e teve em conta a discussão anterior no
seio da nossa doutrina, resolveu então estabelecer como Providências Cautelares,
no âmbito do Contencioso Administrativo, as Providências Cautelares apontadas
pela doutrina.
Se lermos o artigo 112º nº1 do Código actual temos
um “sistema de clausula aberta” em matéria de Providencias Cautelares, quer
seja Conservatória ou Antecipatória (distinção que tem origem no Processo
Civil) – o critério é que se mostrem necessárias e adequadas para garantir o
efeito útil da sentença posterior.
Introduz mecanismo radicalmente diferente, e
portanto só a partir de 2004 podemos verdadeiramente afirmar que passou a haver
tutela cautelar no quadro do Contencioso Administrativo.
Legislador resolveu ainda especificar a titulo
exemplificativo Providências Cautelares que podiam ser requeridas. A abrir o nº2 do
artigo 112º, o legislador diz que remetendo para o CPC, todas as Providências Cautelares
Especificadas no CPC são aplicáveis no âmbito do contencioso administrativo (ou
seja, é um segundo alargamento para alem da clausula geral do 112º nº1).
Houve uma tentativa do legislador para conciliar as
diversas posições consagradas nos anos 80 e 90 na nossa doutrina.
Este mecanismo da tutela cautelar é hoje adequado. Hoje
podemos afirmar que o nosso contencioso já cumpre as exigências constitucionais
e as exigências europeias relacionada com as Providências Cautelares.
Depois temos várias normas que têm que ver com o
regime jurídico das Providencias Cautelares.
Quanto ao momento, o legislador estabeleceu de forma
inovadora, a possibilidade de as Providências Cautelares serem utilizadas antes
do meio principal, sendo que nesse caso, se o meio principal não for intentado,
a Providência Cautelar caduca. Podendo igualmente ser intentada no decorrer da
acção principal.
Há uma clausula nos artigos 120º e 121º que é
excessivamente detalhada, porque o legislador previu hipóteses praticamente
automáticas. Consagra a necessidade de haver um Fumus Boni Iuris: as pretensões
“têm uma fumaça do bom direito”, ou seja, desde que haja uma aparência de
direito, pode em princípio ser procedente a Providência Cautelar.
Por outro lado, o legislador também estabeleceu a
regra da Proporcionalidade, tendo que ser invocado um prejuízo irreparável. O
legislador vai comparar em termos proporcionais as pretensões das partes e vai
decidir de acordo com critérios de proporcionalidade. Professor Vasco Pereira
da Silva diz que se deve afastar esta regra em que se procura encontrar “casos
determinados” que reuniriam esses princípios exigidos.
Vamos as questões de tramitação, analisando aspectos
muito criticáveis no quadro da reforma.
As regras de tramitação da Providencia Cautelar
estão fundamentalmente nos artigos 126º e seguintes (professor faz
interpretação restritiva e aplica apenas à Providência Cautelar de “suspensão
da eficácia”).
A melhor forma de resolver o problema seria a de
adoptar um sistema em que o particular apresenta um pedido, sendo que esse
pedido tem um efeito imediato de suspensão da actuação administrativa em causa
(é o que se verifica, por exemplo, na Alemanha). A suspensão seria automática,
a não ser que o tribunal atribuísse à administração o poder de executar.
Este sistema segundo o Professor Vasco Pereira da Silva
seria muito mais eficaz, ainda que o Legislador da reforma não tenha tido
coragem para fazer isto e “criou um disparate total”.
Em primeiro lugar, aparentemente o artigo 128º nº1
parece ter criado esta logica de suspensão automática do Direito Alemão. Mas a
seguir acrescenta-se “salvo se mediante razão fundamentada, a autoridade
demonstrar que o deferimento da execução seria prejudicial ao interesse
publico” – isto é uma aberração uma vez que estamos a colocar a decisão na mão
da entidade que está a ser julgada!! Isto passou a ser a regra uma vez que não
é muito difícil para a administração fundamentar a execução de um acto
administrativo com base no interesse publico.
O juiz não controla a fundamentação material, quanto
muito controla parcamente a fundamentação – isto está aqui por causa dos
recorrentes “traumas da infância difícil”. Estes resquícios do passado não
fazem qualquer sentido nos dias de hoje.
Os juízes do Supremo Tribunal Administrativo têm
dito que o que está em causa é um pré-procedimento cautelar. Dizem que uma vez
que as decisões sobre Providências Cautelares podem demorar muito tempo, então
devemos criar um pré-procedimento cautelar. Não faz sentido!! O que é “pré” é o
Procedimento Cautelar.
O que o juiz pode é verificar a fundamentação, mas
essa verificação da fundamentação não constitui a analise da Providencia
Cautelar.
Como este sistema tem sido muito criticado, na
reforma da reforma melhorou se um bocadinho o sistema, dizendo que a alegação
fundamentada da administração só pode acontecer numa situação correspondente ao
Estado de Emergência ou Estado de Sítio. Ainda assim, na sua essência este
mecanismo é errado.
Vasco Pereira da Silva diz que era preferível um
sistema que estabelecesse a regra da suspensão automática e depois fixar um
prazo (na Alemanha é de 15 dias) para o Tribunal decidir.
O legislador para além destas regras relativas à
Suspensão Automática, também regula os casos da suspensão de eficácia de normas
(alargamento aos Regulamentos, no seguimento de recomendação da Professora
Carla Amado Gomes).
Diogo Pinto
140111018
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