No contencioso administrativo clássico existia algo que, embora
imperfeitamente, tinha a ver com poderes condenatórios do juiz: no contencioso
de tipo francês dizia-se que quando, perante um pedido de um particular, a administração
nada fazia, o particular podia impugnar esse comportamento por equivaler a um
acto tácito de indeferimento. Isto mostrava já que o contencioso administrativo
não tinha uma função meramente negativa e que o juiz podia determinar
comportamentos da administração. No entanto, esta ideia surgia de forma
disfarçada, através de uma construção que visava que o resultado da anulação do
acto tácito de indeferimento fosse o dever de praticar o acto de sentido
contrário. Havia uma sucessão de ficções (fingia-se que havia um acto de
indeferimento, para se fingir que o juiz anulava esse acto que não existia e
que daí resultava a obrigação de praticar o acto de sentido contrário) que
deixou de ser precisa perante o surgimento, em primeiro na Alemanha, da possibilidade
de perante uma omissão condenar a Administração a praticar o acto devido,
possibilidade esta que foi estendida aos actos de conteúdo negativo, porque em
ambos se denega o direito do particular.
Assim, perante a previsão da modalidade da acção administrativa especial
de condenação à prática do acto devido (arts.º 66º e seguintes do CPTA) não há qualquer
dúvida que o indeferimento tácito caducou (art.º 109º do CPA), porque não faz
sentido invocar um acto tácito de indeferimento quando há um meio processual
que o substitui, para além de ser uma realidade absurda pela sucessão de
ficções que implicava e de não conduzir ao resultado pretendido na maior parte
dos casos.
No entanto, dúvidas maiores se colocam quando ao deferimento tácito
(art.º 108º CPA) que, na opinião do Professor VASCO PEREIRA DA SILVA deveria
ser também afastado, embora o legislador não tenha tratado directamente desta
questão. Esta técnica de considerar que havendo uma omissão se deve presumir
que há deferimento, mesmo sendo excepcional, não se justifica hoje em dia, porque
a Administração tem um dever de decidir, mas também tem um dever de ponderar. Para
além disso, conduz a situações de demora em vez de obrigar a Administração a
actuar rapidamente e o particular nunca fica totalmente garantido (por exemplo,
um particular perante um acto tácito de deferimento do pedido de licença para a
realização de uma obra, tendo de fazer um investimento avultado, não confiará
no mero decurso do tempo em substituição de uma decisão administrativa e, por
isso, na dúvida, não avança, falhando o objectivo de alcançar celeridade).
Questiona-se se o acto de deferimento tácito pode dar lugar a uma acção
de condenação da Administração. O Professor MÁRIO AROSO DE ALMEIDA entende
que não, por estarmos já perante um acto que resultou da lei e que tem conteúdo
positivo. No entanto, o deferimento tácito não equivale à prática de um acto
pela Administração e, mesmo tendo conteúdo positivo, o Professor VASCO
PEREIRA DA SILVA descortina duas situações em que se pode pedir a condenação
da Administração. A primeira é a situação de haver discrepância entre o que o
particular pediu e o que nos termos da lei foi deferido: se o particular pretende
mais do que o efeito do acto tácito de deferimento, então há um indeferimento
parcial da sua pretensão. A segunda situação diz respeito aos actos tácitos positivos com eficácia
múltipla (por exemplo, no sistema de avaliação de impacto ambiental prévio a
qualquer licenciamento de actividade agrícola, comercial ou industrial imposto
por directiva europeia, prevê-se que a autoridade administrativa o possa
dispensar se não for feito dentro de certo prazo) que permitem aos
particulares lesados pedir a condenação da Administração, porque em relação a
eles é acto de conteúdo negativo.
Apesar de continuar previsto, importa dizer que o acto de deferimento
tácito é inconstitucional porque exclui o dever de ponderação, não prosseguindo
o interesse público, ao substituir a decisão administrativa pelo mero decurso
do tempo. De iure condendo, deveria criar-se
um processo urgente que obrigasse a Administração a dar resposta ao pedido do
particular.
Inês Chorro - 140111062
Inês Chorro - 140111062
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