Zeferino, com tão boas intenções de embelezar a sua cidade,
tinha toda a ideia de construir um magnífico prédio de charme, com arquitectura
inspirada no Norte da Europa. Imaginem a sua tristeza quando soube que a Câmara
Municipal não lhe atribuíra a licença de construção necessária.
Não satisfeito, dirigiu-se ao Tribunal Administrativo para
remediar a situação, cabendo-nos agora avaliar toda a sua legitimidade, e a das
suas pretensões.
Primeiro, é necessário averiguar da legitimidade de Zeferino.
Ora, de acordo com o art.9º, é o autor considerado parte legítima quando alegue
ser parte na relação material controvertida.
Quererá isto dizer que o critério determinante do acesso ao
juiz é ter direitos e deveres no âmbito da relação jurídica.
Parece que, por estar em causa uma licença de construção de um
prédio de habitação, e por Zeferino ser um conhecido empresário do ramo
imobiliário, parece que este terá um interesse directo, sendo por isso parte
legítima.
Zeferino pretende, em primeiro lugar, condenar a Câmara
Municipal à concessão da licença de construção. Esta sua pretensão preenche a
hipótese da al. b) do n.º2 do art.46º, o que significa que entramos no âmbito
da acção administrativa especial.
Por se pretender a condenação à prática de acto devido, iremos
aplicar o regime estabelecido os art.66º e seguintes. Estabelece desde logo o
art.66º, n.º1, que “a acção
administrativa especial pode ser utilizada para obter a condenação da entidade
competente à prática, dentro de determinado prazo, de um acto administrativo
ilegalmente omitido ou recusado”, o que será o caso apresentado, uma vez
que houve uma recusa de uma licença de construção.
Não obstante, e como bem refere o n.º2 do referido artigo, não
esquecer que o objecto do processo será sempre a pretensão de Zeferino obter a
licença, e não, por si só e individualmente considerada, a eliminação do acto
de indeferimento.
Olhando para os pressupostos desta acção, podemos enquadrar a
situação aqui apresentada na al. b) do n.º1 do art.67º, uma vez que foi recusada
a prática do acto devido, isto é, uma vez que foi recusada a concessão da
licença de construção.
Vista a acção em causa, podemos agora aprofundar a questão da
legitimidade ao olhar para o art.68º. Neste caso, Zeferino integraria a al. a)
do n.º1, por, pelo menos alegadamente, ser titular de um interesse legalmente protegido
dirigido à emissão desse acto.
Cabe-nos saber que interesse estará em causa. Aqui, podemos
olhar para a Constituição da República Portuguesa onde, no seu art. 65º, n.º1 dispõe
que “todos têm direito, para si e para a
sua família, a uma habitação (…)”, assim, e olhando agora para a al. c) do
n.º2, vemos que “para assegurar o direito à habitação, incumbe ao Estado: estimular a
construção privada, com subordinação ao interesse geral e o acesso à habitação própria
ou arrendada”.
Tudo visto, parece que Zeferino, por ser um conhecido
empresário do ramo imobiliário, terá um interesse legalmente protegido de construção
privada, directamente relacionado com o direito à habitação, que lhe tutelaria
as pretensões de construção do referido prédio de habitação.
Assim, Zeferino será parte legítima.
Podemos ainda indagar acerca da tempestividade da propositura
desta acção. Embora não nos sejam fornecidos dados, podemos ainda assim referir
que, segundo os n.º2 e 3 do art. 69, Zeferino teria de propor esta acção num
prazo de três meses desde a notificação do acto.
Zeferino pretende também que seja aplicada sanção pecuniária
compulsória ao Presidente da Câmara Municipal, até que a referida licença lhe
seja concedida. Essa hipótese encontra-se desde logo prevista no n.º3 do
art.66º quando se refere que “quando o
considere justificado, pode o tribunal impor, logo na sentença de condenação,
sanção pecuniária compulsória destinada a prevenir o incumprimento”. Vai
aqui aplicar-se, por remissão do artigo supracitado, o art.169º.
Estabelece o art.169º, n.º1 que “a imposição de sanção pecuniária compulsória consiste na condenação dos
titulares dos órgãos incumbidos da execução, que para o efeito devem ser
individualmente identificados, ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada
dia de atraso que, para além do prazo limite estabelecido, se possa vir a
verificar na execução da sentença”.
Tudo visto, caso a pretensão de Zeferino seja bem sucedida,
poderá o tribunal impor ao titular do órgão incumbido da execução, portanto, ao
Presidente da Câmara Municipal, a referida sanção pecuniária compulsória que
constará assim de uma quantia a ser paga, por cada dia de atraso, até à
execução da sentença, isto é, até à concessão de licença de construção.
Inês Metello - 140111090
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