sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Comentário à Revisão do CPA e CPTA


            A reforma do Código de Procedimento Administrativo (CPA) e do Código do Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA) corresponde, neste momento a um apecto fundamental do nosso sistema jurídico, pela forma como estes dois diplomas regulam a relação entre a Administração e o Particular.
                Há muito tempo que vários autores e importantes figuras da comunidade jurídica reclamavam de forma consensual esta reforma, apontando-a como algo inevitável, sendo o resultado da dinâmica e evoluções sociais.
                De seguida destaco os aspectos fundamentais das alterações legislativas, baseando o meu comentário no Boletim da Ordem dos Advogados (AO) do mês de Setembro; “Revisão do CPA e CPTA – Leis fundamentais da reforma administrativa”.
                São vários os entendimentos sobre a reforma dos diplomas acima mencionados. Muitos são aqueles que não entendem porque é que o Estado tem uma legislação e tribunais próprios, e não se regula pelas mesmas leis e regras que pautam as relações entre os particulares. Outros tantos, entendem que tais leis deviam ser revistas com mais periodicidade, aproveitando as sugestões da Doutrina e Jurisprudência.
                Uma das principais ideias do novo CPA é o reforço das garantias de imparcialidade e de isenção da Administração no seu relacionamento com os cidadãos. De acordo com o Prof. Sérvulo Correia esta reforma “criou melhores condições de isenção, estabelecendo que, sempre que possível, não seja o titular da competência para a decisão final o responsável pela direcção do procedimento.”
                No novo código de Procedimento Administrativo vem consagrada a possibilidade do particular reagir contra a inércia da Administração, isto é, aumentou-se a responsabilização dos agentes e do sistema administrativo quando não é respeitado o prazo legal para proferir a decisão. O advogado Pires de Lima refere que esta reforma consagrou o “dever de agir por parte da Administração”.
                Quanto à proposta de alteração do Novo Código do Processo dos Tribunais Administrativos a inovação está na redução de formas de processo. Deixa de haver um sistema dualista, passando haver apenas uma acção administrativa. Poderá apresentar-se como uma vantagem pois o particular sabe claramente qual a via que deve seguir, esta medida vem tornar o direito administrativo mais claro, transparente e simples. Na opinião da juíza Conselheira Fernanda Maçãs, esta medida pode beneficiar todos os intervenientes processuais , sendo obviamente um objectivo difícil de alcançar. Importa a meu ver, saber se esta alteração conduz efectivamente num ganho de eficiência e maior celeridade dos tribunais, a comprovar-se será então uma vantagem para o sistema jurídico.
             Pode ainda, na opinião da OA, estar em causa o principio do Juiz Natural, as alíneas b) e c) do art. 26.º n.º2,;
“2 - Para o efeito do disposto no número anterior, são previamente introduzidos no sistema os dados necessários, determinados no respeito pelo princípio da imparcialidade e do juiz natural, de acordo com os seguintes critérios:
a) Espécies de processos classificados segundo critérios a definir pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, sob proposta do presidente do tribunal;
b) Carga de trabalho dos juízes e respetiva disponibilidade para o serviço;
c) Tipo de matéria a apreciar, desde que, no tribunal, haja um mínimo de três juízes afetos à apreciação de cada tipo de matéria.”
                A nova alínea considera que a distribuição deve ser feita pela introdução de determinados critérios no sistema, acontece que os mesmos levantam algumas questões. Esses critérios parecem violar manifestamente o principio do juiz natural, pois alguns tipos de acções seriam conduzidas directamente para um determinado e concreto juiz. A OA defende que a especialização já está feita ao nível do tribunal, e portanto não se pode fazer mais que isso. É suposto que todos os juízes tenham a tecnicidade própria para decidirem sobre todos os processos, estes sistema iria conduzir  a uma especialização da especialização.
                Os procedimentos cautelares e a sua utilização abusiva também são um dos temas de destaque desta reforma.  O art. 118.º vem estabelecer a inadmissibilidade da prova pericial;
“3 - Os meios de prova a utilizar são apenas os oferecidos pelo requerente e pelos requeridos com os articulados, não sendo admissível a prova pericial.”.
e o art. 143.º estabelece que a decisão que indefere a providência cautelar, sem que se tenha pronunciado sobre o mérito da causa passa a ter efeito devolutivo.
“2 - Têm efeito meramente devolutivo os recursos interpostos de: 
a) Intimações para protecção de direitos, liberdades e garantias;
b) Decisões respeitantes a processos cautelares e respectivos incidentes;
 c) Decisões proferidas por antecipação do juízo sobre a causa principal no âmbito de processos cautelares, nos termos do artigo 121.º.”
                 Ambas as normas contestadas pela OA. Quanto ao art. 143.º esta entende que se o recurso da pretensão do particular tiver efeito devolutivo a Administração pode continuar a praticar o seu acto lesivo, porque no final já estará consumado e nada poderá ser feito. Assim a OA defende que a providencia cautelar, que não se pronuncie sobre o mérito da causa, deve passar a ter efeito suspensivo.
                No que diz respeito à utilização abusiva da providência cautelar a revisão do CPTA criou a possibilidade de o juiz aplicar uma taxa sancionatória nos termos da lei processual civil, conforme consagra o artigo 126.º. Na minha opinião tal medida é substancialmente negativa, primeiramente porque se criou um meio de restringir a liberdade do requerente se dirigir ao tribunal e em segundo plano porque o legislador está a dotar o juiz de meios coercivos e dissuasores para a utilização do recurso aos tribunais. Chega mesmo a limitar o juízo técnico do Advogado que patrocina o particular, em certa medida este pode sentir-se intimidado em praticar um acto processual que consideraria adequado e necessário, sob pena de ser condenado ao pagamento de uma taxa que sanciona a sua actuação. Parece-me que deixar nas mãos dos juízes o preencher deste conceito indeterminado, como “utilização abusiva”, sem qualquer restrição ou condição é manifestamente abusivo por parte do Estado. No limite o Advogado será condenado ao pagamento da taxa por actos praticados na defesa dos interesses do patrocinado.
                Quanto à aplicação e entrada em vigor prevê-se que durante muito tempo coexistam as duas legislações. Alterar a legislação a meio dos processos em curso pode beneficiar muita gente mas prejudicar outras tantas pessoas. Parece-me justo que a nova lei apenas se aplique aos novos processos intentados ao abrigo a nova lei. A entrada em vigor deve ser algo cautelosa, prevenindo que os tribunais e toda a justiça administrativa fique parada. Deve existir uma vacatio legis que permita a reorganização dos tribunais e meios humanos, sendo estes capazes assim de dar resposta às novas competências atribuídas aos tribunais administrativos.
 
 
Teresa Ramos  140109030

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