A
reforma do Código de Procedimento Administrativo (CPA) e do Código do Processo
dos Tribunais Administrativos (CPTA) corresponde, neste momento a um apecto fundamental
do nosso sistema jurídico, pela forma como estes dois diplomas regulam a
relação entre a Administração e o Particular.
Há
muito tempo que vários autores e importantes figuras da comunidade jurídica
reclamavam de forma consensual esta reforma, apontando-a como algo inevitável,
sendo o resultado da dinâmica e evoluções sociais.
De
seguida destaco os aspectos fundamentais das alterações legislativas, baseando
o meu comentário no Boletim da Ordem dos Advogados (AO) do mês de Setembro; “Revisão do CPA e CPTA – Leis fundamentais
da reforma administrativa”.
São
vários os entendimentos sobre a reforma dos diplomas acima mencionados. Muitos
são aqueles que não entendem porque é que o Estado tem uma legislação e
tribunais próprios, e não se regula pelas mesmas leis e regras que pautam as
relações entre os particulares. Outros tantos, entendem que tais leis deviam
ser revistas com mais periodicidade, aproveitando as sugestões da Doutrina e
Jurisprudência.
Uma das principais
ideias do novo CPA é o reforço das garantias de imparcialidade e de isenção da
Administração no seu relacionamento com os cidadãos. De acordo com o Prof.
Sérvulo Correia esta reforma “criou
melhores condições de isenção, estabelecendo que, sempre que possível, não seja
o titular da competência para a decisão final o responsável pela direcção do
procedimento.”
No
novo código de Procedimento Administrativo vem consagrada a possibilidade do
particular reagir contra a inércia da Administração, isto é, aumentou-se a
responsabilização dos agentes e do sistema administrativo quando não é
respeitado o prazo legal para proferir a decisão. O advogado Pires de Lima
refere que esta reforma consagrou o “dever
de agir por parte da Administração”.
Quanto
à proposta de alteração do Novo Código do Processo dos Tribunais
Administrativos a inovação está na redução de formas de processo. Deixa de
haver um sistema dualista, passando haver apenas uma acção administrativa.
Poderá apresentar-se como uma vantagem pois o particular sabe claramente qual a
via que deve seguir, esta medida vem tornar o direito administrativo mais
claro, transparente e simples. Na opinião da juíza Conselheira Fernanda Maçãs,
esta medida pode beneficiar todos os intervenientes processuais , sendo
obviamente um objectivo difícil de alcançar. Importa a meu ver, saber se esta
alteração conduz efectivamente num ganho de eficiência e maior celeridade dos
tribunais, a comprovar-se será então uma vantagem para o sistema jurídico.
Pode
ainda, na opinião da OA, estar em causa o principio do Juiz Natural, as alíneas
b) e c) do art. 26.º n.º2,;
“2 - Para o efeito do disposto no
número anterior, são previamente introduzidos no sistema os dados necessários,
determinados no respeito pelo princípio da imparcialidade e do juiz natural, de
acordo com os seguintes critérios:
a) Espécies de processos
classificados segundo critérios a definir pelo Conselho Superior dos Tribunais
Administrativos e Fiscais, sob proposta do presidente do tribunal;
b) Carga de trabalho dos juízes e
respetiva disponibilidade para o serviço;
c) Tipo de matéria a apreciar,
desde que, no tribunal, haja um mínimo de três juízes afetos à apreciação de
cada tipo de matéria.”
A
nova alínea considera que a distribuição deve ser feita pela introdução de
determinados critérios no sistema, acontece que os mesmos levantam algumas
questões. Esses critérios parecem violar manifestamente o principio do juiz
natural, pois alguns tipos de acções seriam conduzidas directamente para um determinado
e concreto juiz. A OA defende que a especialização já está feita ao nível do
tribunal, e portanto não se pode fazer mais que isso. É suposto que todos os
juízes tenham a tecnicidade própria para decidirem sobre todos os processos,
estes sistema iria conduzir a uma
especialização da especialização.
Os
procedimentos cautelares e a sua utilização abusiva também são um dos temas de
destaque desta reforma. O art. 118.º vem
estabelecer a inadmissibilidade da prova pericial;
“3 - Os meios de prova a utilizar
são apenas os oferecidos pelo requerente e pelos requeridos com os articulados,
não sendo admissível a prova pericial.”.
e o art. 143.º
estabelece que a decisão que indefere a providência cautelar, sem que se tenha
pronunciado sobre o mérito da causa passa a ter efeito devolutivo.
“2 - Têm efeito meramente
devolutivo os recursos interpostos de:
a) Intimações para protecção de
direitos, liberdades e garantias;
b) Decisões respeitantes a
processos cautelares e respectivos incidentes;
c) Decisões proferidas por antecipação do
juízo sobre a causa principal no âmbito de processos cautelares, nos termos do
artigo 121.º.”
Ambas as normas contestadas pela OA.
Quanto ao art. 143.º esta entende que se o recurso da pretensão do particular tiver
efeito devolutivo a Administração pode continuar a praticar o seu acto lesivo,
porque no final já estará consumado e nada poderá ser feito. Assim a OA defende
que a providencia cautelar, que não se pronuncie sobre o mérito da causa, deve
passar a ter efeito suspensivo.
No
que diz respeito à utilização abusiva da providência cautelar a revisão do CPTA
criou a possibilidade de o juiz aplicar uma taxa sancionatória nos termos da lei
processual civil, conforme consagra o artigo 126.º. Na minha opinião tal medida
é substancialmente negativa, primeiramente porque se criou um meio de
restringir a liberdade do requerente se dirigir ao tribunal e em segundo plano
porque o legislador está a dotar o juiz de meios coercivos e dissuasores para a
utilização do recurso aos tribunais. Chega mesmo a limitar o juízo técnico do
Advogado que patrocina o particular, em certa medida este pode sentir-se intimidado
em praticar um acto processual que consideraria adequado e necessário, sob pena
de ser condenado ao pagamento de uma taxa que sanciona a sua actuação. Parece-me
que deixar nas mãos dos juízes o preencher deste conceito indeterminado, como “utilização
abusiva”, sem qualquer restrição ou condição é manifestamente abusivo por parte
do Estado. No limite o Advogado será condenado ao pagamento da taxa por actos praticados
na defesa dos interesses do patrocinado.
Quanto
à aplicação e entrada em vigor prevê-se que durante muito tempo coexistam as
duas legislações. Alterar a legislação a meio dos processos em curso pode
beneficiar muita gente mas prejudicar outras tantas pessoas. Parece-me justo que a nova
lei apenas se aplique aos novos processos intentados ao abrigo a nova lei. A entrada
em vigor deve ser algo cautelosa, prevenindo que os tribunais e toda a justiça
administrativa fique parada. Deve existir uma vacatio legis que permita a reorganização dos tribunais e meios
humanos, sendo estes capazes assim de dar resposta às novas competências atribuídas
aos tribunais administrativos.
Teresa Ramos 140109030
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