O legislador
consagrou neste preceito o alargamento da legitimidade para a apresentação de
pedidos de condenação também no que respeita à defesa de legalidade e do
interesse público. De forma a salvaguardar a acção pública, o art. 68.º, n.º 1,
al. c) CPTA, confere legitimidade ao Ministério Público para requerer a
condenação à prática de actos administrativos legalmente previstos. Assim, introduzindo
assim uma componente “objectivista” num instituto “subjectivista”. Contudo, o
legislador fê-lo fixando alguns limites ao estabelecer no preceito que “o
Ministério público só pode formular pedidos de condenação quando o dever de
praticar o acto resulte directamente da lei e esteja em causa a ofensa de
direitos fundamentais, de um interesse público especialmente relevante ou de
qualquer dos bens referidos no artº 9 nº2”.
O professor Vasco Pereira da Silva considera que no entanto, foi feito
de forma infeliz pois se é razoável a intervenção substitutiva do Ministério
Público em matéria de direitos fundamentais que são direitos subjectivos e
valores fundamentais do ordenamento jurídico, já a remissão para as situações
tuteláveis através de acção popular sem qualquer restrição, sem restrições
quanto à importância dos interesses em jogo é manifestamente inadequada. Pondo
mesmo em causa a própria intenção legislativa de estabelecer limites. Este
autor classifica como necessária uma interpretação correctiva do preceito, ou
seja, esta só se verifica em razão do “espírito do sistema” quando estejam m
causa interesses públicos particularmente relevantes. Outra questão que
assombra esta alínea é o da compatibilização do pressuposto processual da
legitimidade do Ministério Público com o dos pressupostos relativos ao
comportamento da Administração. Efectivamente, os pedidos de condenação são
admissíveis tanto perante omissões de comportamento da Administração (pedidos
apresentados por particulares) como perante actos administrativos de conteúdo
negativo (direitos subjectivos dos privados). Como escreve Vieira de Andrade “estes
requisitos indiciam que o pedido tem um alcance subjectivista, destinado à
satisfação de direitos ou interesses legalmente protegidos do autor, mas
verifica-se que a legitimidade se alarga à acção coletiva, à acção popular e à
acção pública.” A contradição legislativa entre objecto e função do processo /
legitimidade torna-se ainda mais evidente nas omissões administrativas pois as
normas de processo quer as de procedimento fazem depender a relevância jurídica
do silêncio da Administração de um pedido do particular. Por isso a melhor
forma de compatibilizar é a de considerar que só é admissível a intervenção do
Ministério Público quando tenha sido emitido um acto administrativo de conteúdo
negativo mas não quando seja uma qualquer omissão administrativa. Já Mário
Aroso de Almeida que consideram que o Ministério Público gozaria de
legitimidade em ambos os casos preocupando-se apenas com os requisitos da
omissão juridicamente relevante. Como refere este autor, “o poder de actuação
do Ministério Público, neste domínio, às situações em que o dever de praticar
um acto seja um dever objectivo , que resulte da lei, sem dependência da
apresentação de qualquer requerimento.” Nesses casos, o Ministério Público não
tem de apresentar um requerimento dirigido à prática do acto objectivamente
devido, nem de aguardar por uma resposta a esse requerimento para poder pedir a
condenação da Administração ao comportamento do seu dever objectivo de agir. Por
seu lado, Vieira de Andrade convoca o respeito pelo princípio da provocação ou
seja que a Administração tenha sido interpelada para a emissão de um acto
administrativo mesmo quando se trate de um acto cuja prática seja imposta
directamente pela lei (iniciat8va do processo pelo Ministério Público). Só
neste caso não haverá necessidade de um requerimento prévio embora se deva
exigir pelo menos a comprovação de um atraso manifesto e desrazoável no
cumprimento da lei. O professor Vasco Pereira da Silva considera que a questão
está mal colocada pois é a legitimidade que tem de ser interpretada em razão da
função e objecto do processo procurando compatibilizar aquele pressuposto
processual com os restantes e não o contrário. Se o regime jurídico dos pedidos
de condenação tem uma função maioritariamente subjectiva , se o objecto do
processo é o direito ao acto administrativo devido mas se consagrou também a
possibilidade de intervenção do actor público e do autor popular então deve
corresponder a situações especiais em que se justifique esse alargamento de
legitimidade para defesa da legalidade e do interesse público. Se as duas
modalidade do pedido de condenação dependem de um comportamento omissivo da
Administração e de um acto administrativo de conteúdo negativo resulta
inequivocamente, que o alargamento da legitimidade ao Ministério Público e ao
autor popular apenas pode ter lugar quando se está perante um acto
administrativo de conteúdo negativo. E esta solução é também a mais lógica do
ponto de vista dos interesses em jogo. O facto, é que é mais grave a emissão de
acto administrativo ilegal do que a verificação de uma omissão de comportamento
ilegal. E isto justifica o tratamento diferenciado das duas situações.
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