No caso sub
judice estão plasmadas as seguintes questões:
1- Averiguar se o Dr. Anacleto poderá
propor uma acção de anulação do acto administrativo;
2- A cumulação de pedidos: pode requer
para além da anulação do acto administrativo, poderá pedir a reparação dos
danos patrimoniais sofridos na mesma acção?;
3- Aquando do presidente da Camara
responder para o jornal que o prazo já foi ultrapassado; determinar se foi ou não
ultrapassado;
4- O presidente da Camara considerou que
houve aceitação tácita do acto por parte do Dr. Anacleto;
Para a
resolução do problema do Dr. Anacleto torna-se imperioso começarmos por
analisar os pressupostos da acção de impugnação consubstanciadas nos artigos
51° até 58°. Estamos no domínio da acção administrativa especial através do
qual são tuteláveis direitos subjetivos das relações jurídicas administrativas.
Esta consiste numa acção que permite a formulação de vários pedidos dando
origem a uma correspondente diversidade de efeitos de sentenças. No caso em
análise pretendia-se a anulação de um acto administrativo como indica o art°
46/2 do cpta. A acção de impugnação de actos administrativos é vista como uma
sub-espécie da acção administrativa especial que o legislador da reforma tratou
com “carinho” como revela o Professor Vasco Pereira da Silva.
- O acto administrativo impugnável: é o artº 51/1 que nos dá a primeira pista de resolução dizendo que são os impugnáveis os actos da administração aqueles que cumprirem dos requisitos, ou seja, que tenham eficácia externa (efeitos externos) e que lesem direitos ou interesses legalmente protegidos. O professor Vasco Pereira da Silva considera correcta a solução adoptada pelo legislador, contudo a formulação do preceito é infeliz na medida em que se subsume que o critério mais amplo é o da eficácia externa., sendo o 2º critério uma mera especificação dentro do primeiro, quando na verdade estamos perante dois critérios autónomos, com natureza distinta e função. Vai mais longe, dizendo que é de “saudar a orientação o legislador no sentido de determinar a impugnabilidade dos actos administrativos em razão da eficácia externa e da lesão dos direitos dos particulares , afastando assim expressamente toda e qualquer exigência de recurso hierárquico necessário”. Ambos os requisitos se verificam na nossa hipótese prática.
- Legitimidade: Neste domínio valem os artigos 55º, 9º e 10º. Começando pelo art°9 referente à Legitimidade activa é essencial referir que não se esgota neste preceito o regime que o cpta estabelece a seu respeito. Como resulta do próprio teor do n° 1 estabelece se um critério que é derrogador um amplo conjunto de soluções especiais como revelam os artgs 40°, 55°, 57°,68° e 63°. O critério consagrado no art°9 é de aplicabilidade residual. Como ensina o Professor Mário Aroso de Almeida, possui legitimidade activa quem alegue a titularidade de uma situação cuja conexão com o objecto da acção proposta o apresente como em condições de nela figurar como autor. Efectivamente, o princípio geral previsto no art. 9/1 tem que ser articulado com disposições especiais de legitimidade, previstas para as acções administrativas especiais, que apelam a critérios diferentes. É o que acontece na acção administrativa especial prevista no art. 55º/1. De acordo com este artigo o Dr. Anacleto tem legitimidade activa para impugnar o acto administrativo. Este possui um interesse directo e pessoal por ter sido lesado nos seus direitos (no seu direito de propriedade) e nos seus interesses legalmente protegidos (direito ao ambiente). Para o Professor Mário Aroso de Almeida só o carácter “pessoal” diz respeito ao pressuposto da legitimidade, na medida em que se trata de exigir que a utilidade que o interessado pretende obter com a anulação ou a declaração de nulidade do acto impugnado seja uma utilidade pessoal que ele reivindique para si próprio, de modo a poder afirmar-se que o impugnante é considerado parte legitima porque alega ser, ele próprio, o titular do interesse em nome do qual se move no processo. Já o carácter “directo” do interesse tem que ver com a questão de saber se existe um interesse actual e efectivo em pedir a anulação ou nulidade do acto que é impugnado, ou seja, tem que ver com o interesse processual ou interesse em agir. Por isso, o carácter directo não é reconhecido quando se mostre meramente eventual. Não nos esqueçamos que a nossa Constituição define a protecção do ambiente numa dupla vertente ou seja, como uma tarefa do Estado e como um Direito de todos, a ser protegido. Esse Direito esta consagrado no capitulo dos direitos e deveres sociais , onde é proclamado o direito de todos os cidadãos a "um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado", bem como o dever de todos o defender (artº66CRP). Uma das grandes características do direito ao ambiente reside no facto de não ser possível a apropriação individual do seu objecto, que é um bem uno e partilhado de forma igual por um número indeterminado de pessoas. Tal como os restantes direitos sociais, o direito ao ambiente implica a abstenção, por parte de terceiros e do próprio Estado, de acções que lesem o ambiente e ainda a prestação do Estado para a defesa do mesmo. É exigido ao Estado uma politica ambiental de forma a que se previna e controle a poluição, exista um aproveitamento sustentável e racional dos recursos natural, uma promoção da qualidade ambiental das povoações e da vida urbana, em especial através do ordenamento do território, entre outras tarefas que o Estado deve promover. Para além disso como indica o 9/2 independentemente de ter interesse na demanda qualquer pessoa tem legitimidade para propor em processos principais e cautelares destinados à defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos. Há aqui um fenómeno de extensão da legitimidade. Neste seguimento de ideias surge o 55/ nº 1 f) onde se consagra que tem legitimidade activa todos aqueles mencionados no 9/2. Por sua vez, tem tem legitimidade passiva a camara nos termos do 10/1. Como tal, o argumento de que o aterro se encontra a mais de 1 km da propriedade do Dr. Anacleto não procede uma vez que não é fundamento suficiente para este sujeito perder a legitimidade que possui. Um aterro sanitário é um local destinado à deposição final de resíduos sólidos gerados pela atividade humana. Neste são dispostos resíduos domésticos, comerciais, de serviços de saúde, da indústria de construção, e também resíduos sólidos retirados do esgoto. Por isso, é evidente a lesão causada ao particular. A sua propriedade será tremendamente afectada na medida em que estes locais deitam cheiros nauseabundos por isso a sua propriedade perderá valor de mercado.
- Oportunidade: é um pressuposto processual específico. O artº 58º estabelece os prazos de impugnação de acto administrativo introduzindo um ligeiro aumento quando comparado com o direito anterior. O preceito estatui que o Dr. Anacleto tem 3 meses para o fazer. Torna-se então determinar se estamos perante um acção popular ou se por sua é uma acção pública. O prazo é de 3 meses para defesa de interesses próprios ou de acção popular e de 1 ano se for uma acção pública. Na hipótese prática não sabemos datas logo não conseguimos determinar com precisão se o Dr. Anacleto estão ou não fora do prazo. O professor Vasco Pereira da Silva sauda o novo código com a introdução de mecanismos de flexibilização da “lógica da irremediabilidade dos prazos” que é um corolário do princípio da justiça material. Passado o decurso do prazo (leia-se um ano) o particular já não pode impugnar o acto contudo pode pedir a responsabilização civil da Administração Pública.
No tocante ao pedido , o artº 4º permite a cumulação de pedidos. O artº 47º elenca os casos em que tal é possível. No nosso caso aplica-se o nº 1 e o nº 2 alinea b). Como tal, o Dr. Anacleto pode, na mesma acção, cumular um pedido de impugnação de uma deliberação camarária e um pedido de indemnização de danos patrimoniais sofridos como indica o artº4 nº1 a) e 4,2 f). Finalmente, falemos na questão introduzida pelo presidente da Câmara isto é, da possibilidade de ter havido uma aceitação do acto administrativo por parte de Anacleto. Para tal, tendo como pano de fundo o artº 56º resta-nos analisar se o comportamento do particular revela expressa ou tacitamente a aceitação do acto. Não considero que tenha havido aceitação tácita, até porque as declarações feitas pelo presidente da Camara ao jornal não têm força legal nenhuma.
Margarida Quintino: 140109036
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