Apesar de a nossa cadeira não se chamar Contencioso Administrativo e Tributário, não poderia deixar de partilhar um tema interessante e actual, noticiado hoje pela imprensa nacional.
O sistema de cobrança coerciva aplicado pelas Finanças à falta de pagamento de portagens por parte dos contribuintes está a dificultar a sua contestação e a congestionar os tribunais com pedidos de impugnação. Nos tribunais fiscais haverá neste momento alguns milhares de processos.
Se um contribuinte não pagar uma portagem a uma concessionária de auto-estrada, o processo é remetido para a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), que desde 2013 assumiu a competência directa de instaurar o processo de contra-ordenação, com a possibilidade de reter devoluções de impostos, de penhorar depósitos bancários, salários ou outros bens.
Ora, o processo de cobrança coerciva de portagens pode dificultar o recurso à justiça por parte de cidadãos envolvidos nestes processos. Sucede que, cada taxa de portagem não paga pelo contribuinte, mesmo que no mesmo dia ou com diferença de poucas horas, dá origem a um processo autónomo por parte da concessionária e, numa segunda fase, a um processo por parte da administração fiscal. Isto implica que cada portagem não paga terá associado um custo administrativo e uma coima – o que faz disparar os valores a pagar – e significa ainda que as impugnações têm de ser feitas individualmente.
Ao mesmo tempo que a máquina fiscal trabalha a todo o gás para cobrar coimas de taxas de portagem de concessionárias de auto-estradas, os tribunais fiscais enchem-se de processos de impugnação judicial, praticamente o único meio de defesa dos contribuintes quando são confrontados com a cobrança coerciva por parte das Finanças nestas situações.
A junção, num só processo, de todas as taxas não pagas num determinado período, o que implicaria custos administrativos e coimas muito mais reduzidos para os cidadãos, não acontece. O prazo dado aos contribuintes para apresentarem reclamações ou pedirem esclarecimentos são curtos e esses pedidos não tem efeitos suspensivos. Na prática, apenas o recurso aos tribunais suspende o agravamento das coimas e dos custos administrativos.
Mais, põe-se seriamente em causa a eficácia no combate à fraude e à evasão fiscal por grande parte dos funcionários afectos à justiça tributária estar a tratar de processos relativos às dívidas e contra-ordenações relacionadas com taxas de portagem.
Recorde-se que, segundo o antigo modelo de cobrança, cabia às operadoras a instauração do processo de contra-ordenação, sendo a intervenção do fisco apenas requerida no final da execução fiscal da dívida.
Qual, então, a legitimidade da colocação de um serviço público a cobrar taxas de uma actividade de empresas privadas? Justifica-se apenas por as empresas envolvidas serem concessionárias de um serviço público, apesar de este ter sido concedido a um particular?
Qual, então, a legitimidade da colocação de um serviço público a cobrar taxas de uma actividade de empresas privadas? Justifica-se apenas por as empresas envolvidas serem concessionárias de um serviço público, apesar de este ter sido concedido a um particular?
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