domingo, 16 de novembro de 2014

Análise do artigo 73° do CPTA


- normas imediatamente operativas vs. normas mediatamente operativas -

Iniciamos a exploração do preceito chamando à colação o modelo dicotómico de impugnação. O cpta uniformizou o regime processual da impugnação de normas mas manteve a dicotomia entre normas imediatamente operativas (produzem efeitos imediatamente na esfera jurídica dos interessados) e normas mediatamente operativas (só é susceptível de operar os seus efeitos através de actos administrativos de aplicação a situações individualizada). Também há distinção quanto aos efeitos do pedido de declaração de ilegalidade. Isto é, se uma norma for imediatamente operativa não impede que seja igualmente objeto de um pedido de declaração de ilegalidade com efeito erga omnes. Acontece que tal norma pode ser impugnada directamente , independentemente da prática de um acto de aplicação , mas com efeitos circunscritos ao caso concreto, ao passo que, o pedido de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, quando apresentado por particulares terá de preencher o pressuposto previsto no n°1, isto é, depende da ocorrência mediante decisão judicial, de três casos concretos de desaplicação. É este o sentido útil da ressalva contida do n°2. Efectivamente, o ministério publico pode pedir a declaração de ilegalidade com força obrigatória geral sem necessidade da verificação da recusa de aplicação da norma em três casos concretos. O lesado por uma norma directamente aplicável, mas já incidentalmente julgada ilegal por três vezes não esta obrigado a pedir a declaração de ilegalidade dessa norma com força obrigatória geral. Questão que se tem de responder é saber se o caracter imediatamente ou medianamente operativo para o efeito de poder ser admitida a impugnação directa de uma norma, mediante o pedido de desaplicação ao caso concreto, se deve reportar ao regulamento globalmente considerado ou apenas a uma norma especifica que nele se inclua. O acórdão do STA de 25 de Novembro de 2003 refere se expressamente sobre esta questão. Concluía-se que “o regulamento não conferia nem retirava direitos, pelo que só o acto administrativo que viesse a recair sobre um concreto pedido de inscrição é que seria susceptível de definir a situação jurídica do interessado”. Como ensina o Professor Mário Arosa de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cacilhas o objeto do processo de impugnação de normas como resulta de literalidade do artigo 72° é qualquer norma administrativa que se inclua num diploma de natureza regulamentar, pelo que o qualificativo de imediata ou mediata operatividade de que depende a escolha do meio processual a adoptar reporta-se necessariamente à norma e não ao regulamento considerado no seu todo. Na verdade, a exequibilidade de uma norma pode estar dependente da verificação de certos requisitos ou do preenchimento de certas formalidades que apenas possam ser objecto de concretização no âmbito e um procedimento administrativo, exigindo a ulterior pratica de um acto administrativo. Para se determinar se produz ou não efeitos imediatos, a norma carece de ser interpretada em conjugação com outros preceitos regulamentares. Contudo, não é necessário pré-determinar o carácter operativo da norma em função do objecto e da finalidade de diploma regulamentar onde se insere. Efectivamente, o acento tónico deve incidir no caracter mediata ou imediatamente lesivo da norma. Se a norma pelo seu próprio conteúdo, tornar desde logo inviável a inscrição, de tal modo que o procedimento que venha a ser encetado se encontre necessariamente votado ao insucesso, é de entender que ela é imediatamente lesiva e como tal susceptível de ser impugnada directamente. Outra solução levaria à inutilização do requisito processual. Seguidamente, vamos analisar a legitimidade do Ministério Público, a legitimidade dos particulares, a situação dos defensores de interesses difusos e a desaplicação em 3 casos concretos. Dito isto a norma estipula dois tipos de pressupostos processuais: um relativo às partes (legitimidade activa) e outro relativo ao processo (existência de três casos concretos de recusa de aplicação da norma por um Tribunal, ou noutros casos, o carácter imediatamente operativo da norma). A legitimidade activa é reconhecida ao Ministério Público, ao lesado ou a um potencial lesado com a aplicação da noma e às pessoas ou entidades que possam intervir na defesa de interesses difusos. A iniciativa processual do MP corresponde não exercício da acção pública e constitui uma decorrência da competência que que a esse órgão se encontra atribuída para a defesa da legalidade. A norma do nº 3 tem correspondência com as dos artigos 55º nº 1 alínea b) e 68º nº1 alínea c) que conferem legitimidade ao MP para as acções de impugnação de acto administrativo e de condenação à prática de acto devido. Agora, no tocante aos particulares, o critério da legitimidade é definido em função da lesão ou da ameaça de lesão de direitos ou interesses legalmente protegidos. Quando pretenda obter uma declaração judicial de ilegalidade com força obrigatória geral, o interessado poderá provocar, conforme os casos, a lesão ou a ameaça de lesão de direitos ou interesses: haverá lesão se a norma for imediatamente operativa ou, sendo mediatamente operativa, o interessado tiver sido já sujeito passivo de uma estatuição concreta adoptada com base nessa norma. Haverá simples ameaça de lesão se, sendo a norma imediatamente operativa , se torar previsível que o particular venha a ser destinatário de um acto administrativo de aplicação. Contrariamente, numa norma imediatamente operativa o particular quando pretenda unicamente obter a desaplicação da norma com efeitos circunscritos ao seu caso, invoca a lesão de direitos ou interesses que resulta do facto de os efeitos da norma se projectarem directamente na sua esfera jurídica. Isto reflecte-se na diferente terminologia que o legislador adoptou no 73º nº 1 e 2.:
·         Pedidos de declaração de ilegalidade: com força obrigatória geral: a legitimidade é atribuída a quem seja prejudicado pela aplicação da norma ou possa previsivelmente vir a sê-lo em momento próximo. Abre-se a possibilidade de estar em causa uma mera lesão de direitos;
·         Pedidos de desaplicação a lei confere essa mesma legitimidade apenas ao lesado pressupondo que tratando-se de normas imediatamente operativas: único caso em que esse pedido de desaplicação pode der lugar ocorre sempre uma lesão;
Poderá estar em causa uma posição jurídica substantiva ou um mero interesse de facto. O legislador ao referir-se ao prejudicado pela aplicação da norma ou a (quem) possa previsivelmente vir a sê-lo em momento próximo e ao lesado, prescinde da aplicação estrita do critério de legitimidade constante no artº9 admitindo que possa ser invocado um mero interesse processual.Já em relação à situação dos defensores de interesses difusos, a legitimidade activa é também reconhecida às pessoas ou entidades que possam intervir na defesa de interesses difusos. É uma concretização prática do critério geral de legitimidade que se encontra consagrado no artº 9/2. A legitimidade autónoma no âmbito da acção popular circunscreve-se, no entanto, aos pedidos de desaplicação de normas. No tocante aos pedidos de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, os titulares de interesses difusos apenas poderão suscitar a intervenção do mp podendo assumir no respectivo processo a posição de assistentes. Isto justifica-se pelo facto do mp poder intentar o pedido de declaração daquele tipo, sem necessidade de prévia verificação da recusa da aplicação da norma em três casos concretos. Na verdade, parece não admitir-se que os titulares de interesses difusos deduzam pedidos de declaração de ilegalidade de normas com força obrigatória geral por iniciativa própria mediante o prévio preenchimento do requisito processual do nº1. Embora se possa afirmar que o direito de acção popular se encontra coberto pela regra geral do artº 9/2 a verdade é que na especialização concreta dos pressupostos processuais aplicáveis aos pedido de declaração de ilegalidade de norma com força obrigatória geral o artº 73/1 restringe a legitimidade. O segundo pressuposto processual remete à exigência de três casos concretos de recusa de aplicação da norma por um Tribunal ou à natureza imediatamente operativa da norma. Perante a declaração de ilegalidade com força obrigatória geral, a formulação do pedido depende necessariamente da prévia ocorrência de três casos concretos de desaplicação mediante decisão judicial (salvo se o impugnante for o ministério Público). Enquanto, um pedido de desaplicação com efeito circunscritos ao caso concreto, já não é exigível este requisito. Por sua vez, o processo só poderá prosseguir se a norma impugnada for susceptível de produzir efeitos imediatos. A condição imposta no nº1 justifica-se por razões de segurança jurídica e prende-se com os efeitos erga omnes da decisão judicial, quando esta é de declaração de ilegalidade com força obrigatória geral. É inspirada na solução consagrada no artº 281º/3 (fiscalização da constitucionalidade das leis).

Margarida Quintino: 140109036

Sem comentários:

Enviar um comentário