Estamos perante um caso da
competência dos tribunais administrativos, nos termos do art.º 4º nº1 alíneas
a) (tutela
de direitos fundamentais, neste caso o direito de propriedade – art.º 62º da
CRP) e g) (responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas
de direito público).
O Dr. Anacleto, para reagir
contenciosamente, deve intentar uma acção de impugnação de actos
administrativos (art.º 50º e ss.), podendo cumular os pedidos de anulação e de
condenação da administração ao pagamento de uma indemnização por danos
patrimoniais (art.º 4º nº1 a) e nº2 f)). Embora haja cumulação de pedidos, a
forma de processo seguirá a forma da acção administrativa especial, com as
adaptações necessárias (art.º 5º nº1).
Assim, o pedido imediato, ou
seja, o efeito pretendido pelo autor, é a anulação e o pagamento de uma
indemnização, enquanto o pedido mediato, isto é, o direito que esse efeito visa
defender, é o direito de propriedade do Dr. Anacleto.
A causa de pedir, que num
contencioso subjectivista como o nosso, é entendida em conexão com as
pretensões das partes (resulta do art.º 95/1 CPTA), é a actuação administrativa
trazida a juízo de acordo com as alegações das partes, ou seja, a violação do
direito de propriedade do Dr. Anacleto com a construção do aterro.
Num contencioso pleno, tanto o
particular como a administração são partes que defendem as suas posições
perante o juiz: a administração defende a legalidade e interesse público e o
particular o seu direito.
Os pressupostos processuais da
acção de impugnação de actos administrativos são:
1. Acto
administrativo impugnável;
2. Legitimidade;
3. Oportunidade.
No presente caso, estamos perante
uma acto administrativo impugnável, uma vez que na acção jurídica subjectiva o
critério para aferir este pressuposto é a lesão de direitos ou interesses
legalmente protegidos (o direito de propriedade do Dr. Anacleto).
Há também legitimidade activa do
Dr. Anacleto, nos termos do art.º 55º nº1 a) e 9/1, uma vez que alega ser
titular de um interesse directo e pessoal, designadamente por ter sido lesado
pelo acto nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos. Há
legitimidade passiva da Câmara Municipal nos termos do art.º 10/1. A alegação do
Presidente da Câmara Municipal de que o Dr. Anacleto não teria legitimidade para
propor a acção na medida em que o aterro sanitário se encontra a mais de 1KM de
distância da sua propriedade, pode significar que o Dr. Anacleto não tem
interesse na demanda, porque a construção do aterro não afecta o seu direito de
propriedade, mas não deixaria de ter legitimidade, porque poderia ter
legitimidade nos termos do art.º 55/1 f) que remete para o art.º 9/2 que
estatui que, independentemente de ter interesse na demanda, qualquer pessoa tem
legitimidade para propor e intervir, nos termos previstos na lei, em processos
principais destinados à defesa de valores e bens constitucionalmente
protegidos, que neste caso seriam o ambiente e qualidade de vida.
Quanto à oportunidade, o
Presidente da Câmara Municipal alega que já decorreu o prazo para impugnar os
actos administrativos, previsto no art.º 58º nº2 b) que prevê o prazo de três
meses. Não havendo dados no caso, se esse prazo já tiver decorrido, pode haver
possibilidade de impugnar o acto dentro do prazo de 1 ano desde que haja uma
das razões justificativas enunciadas no art.º 58/4. Para além disso, o decurso
do prazo só tem efeitos processuais, o particular deixa de poder impugnar
aquele acto, mas não perde o direito de tutelar os direitos que são lesados por
aquele acto, não havendo nenhum efeito de sanação do acto pelo decurso do prazo
(o art.º 38º reforça esta ideia). Aquilo que se veda pelo decurso do prazo é a
possibilidade de obter efeito que resultaria da anulação do acto, mas não outros
efeitos, pelo que, mesmo que tivesse decorrido o prazo, poderia sempre pedir a
indemnização pelos danos patrimoniais causados pelo acto.
O Presidente da Câmara Municipal alega
que o Dr. Anacleto aceitou o acto administrativo praticado na medida em que já
depois de ter tido conhecimento da sua emissão adquiriu outra propriedade contígua
ao aterro.
O art.º 56º vem estabelecer que
não pode impugnar um acto, quem o tenha aceitado, expressa ou tacitamente,
depois de praticado.
Neste caso, de acordo com a
alegação supracitada, estaríamos perante uma aceitação tácita do acto que
precludiria o direito de o impugnar contenciosamente.
Este artigo vem inserido
sistematicamente a propósito da legitimidade processual na modalidade de
impugnação de actos administrativos da acção administrativa especial, mas é um
pressuposto autónomo que é o interesse em agir. É duvidoso que isto possa
precludir o direito fundamental de impugnação que é um direito indisponível
(art.º 268º nº4 CRP). Esta dúvida ainda se adensa mais quanto à aceitação
tácita. Qual o comportamento que mostra que o destinatário do acto se conforma
com ele? A compra de um terreno contíguo é um facto que com toda a
probabilidade revela a vontade de se conformar com a construção do aterro?
O princípio solve et repete implica que o destinatário possa aceitar produção
de efeitos e depois impugnar e não se vê razão para isso não ser legitimo.
Para além disso, a formulação do
art.º 56º é errada: o particular deve poder a qualquer momento impugnar o acto,
só não pode se estivermos perante um direito disponível, se o fizer por escrito
e se estiver em causa um interesse fundamental da administração.
Inês Chorro - 140111062
O art.9º, n.º2 a que se referem é de que Código?
ResponderEliminar